quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Mais um texto sobre A ética protestante e o 'espírito' do capitalismo

Como já assinalado, num texto anterior aqui no blog Arquitetura, cidade e projeto o livro de Max Weber, com o título A ética protestante e o 'espírito' do capitalismo é uma incrível oportunidade para refletir sobre o processo histórico de longa duração, que acabou consolidando o sistema capitalista como forma hegemônica de operar. No outro texto assinalei uma certa tendência do sistema  a anular a concorrência, em nome da construção de monopólios, em função da polêmica do UBER e dos táxis, que dominou a agenda há alguns dias atrás.

A longa transição entre o feudalismo e o capitalismo, que criou nuances históricas entre estados nacionais, como o capitalismo mercantilista, uma certa manutenção de princípios feudalistas, ou ainda um capitalismo financeiro, desembocaram em nossa contemporaneidade, onde o sistema parece ter dominado toda a face do planeta Terra, e quando, se percebe uma clara hegemonia do sistema financeiro. Weber coloca de forma apropriada a lenta conquista dos corações e mentes pelo sistema capitalista, na qual as mentalidades e as práticas cotidianas geradas pela reforma desempenharam importante papel;
"Para que essas modalidades de conduta de vida e concepção de profissão adaptadas as peculiaridades do capitalismo pudessem ter sido 'selecionadas', isto é, tenham podido sobrepujar outras modalidades, primeiro elas tiveram que emergir, evidentemente, e não apenas em indivíduos singulares isolados, mas sim como um modo de ver portado por grupos de pessoas...Por ora, é suficiente para nosso propósito indicar: que na terra de Benjamim Franklin (o Massachusetts) o 'espírito do capitalismo' no sentido por nós adotado existiu incontestavelmente antes do 'desenvolvimento do capitalismo'." Página 48 WEBER, 2004
Weber aponta o abandono da condenação da prática da usura, a concepção do esforço profissional de cada um como uma forma de louvação a Deus, e a idéia de pré-destinação como fundadores de práticas, que impulsionaram a forma de operar do capital, todas presentes no protestantismo. Interessante também os dados apresentados mostrando a maior aproximação dos protestantes com as carreiras técnicas, enquanto os católicos permaneciam nas áreas humanas, apesar da clara tendência de um maior investimento na formação profissional por parte da reforma. A palavra alemã Beruf, que pode ser traduzida por vocação ou profissão, e que muitas vezes envolve o imbricamento dos dois registros, podendo ser; vocação profissional ou profissão como vocação, esclarece muito das concepções divergentes entre católicos e protestantes. Weber irá contrapor a forma de encarar a vida monástica pelos católicos, à maneira de entender as profissões intra mundanas pelos protestantes, esmiuçando a visão desses últimos;
"Ora, a conduta de vida monástica é encarada não só como evidentemente sem valor para a justificação perante Deus, mas também como produto de uma egoística falta de amor que se esquiva aos deveres do mundo. Em contraste com isso, o trabalho profissional mundano aparece como expressão exterior do amor ao próximo.." Página 73 WEBER, 2004
Weber também aponta nuances na visão de mundo dos protestantes, apontando que o luteranismo permaneceu condenando a usura e celebrando esse afastamento do mundo dado pela vida monástica. Aponta também uma maior generosidade com o mundo por parte dos jesuítas, católicos da contra-reforma, que promoveram maior adaptação ao cotidiano, pelo probabilismo e uma clara vertente de inclusão de uma diversidade de visões.

A construção da hegemonia de determinadas ideias é sem dúvida um processo de longa duração, mas volta e meia é importante perguntar. Como suportar o cotidiano, nessas condições?

Nenhum comentário:

Postar um comentário