domingo, 30 de outubro de 2016

PEC241, Hegemonia Rentista e o Interesse Público

Num gráfico, que teve ampla divulgação pelo Senado Federal em Brasília, no qual foi mostrada a composição da dívida pública brasileira no ano de 2014, considerando um orçamento da União já executado de R$2,168trilhões. Segundo essa figura, que está mostrada ao lado, 45,1% correspondem a juros e amortizações da dívida, ou R$978milhões, a Previdência Social correspondem 21,8%, ou R$472milhões, e gastos classificados como outros somam 16,2%, ou R$351milhões. Apenas, 9,2% correspondem às Transferências a Estados e Municípios, 4% à Saúde, e 3,7% à Educação. Portanto, podemos dizer que 66,9% - Juros e Amortizações, mais Previdência Social - da dívida pública brasileira está destinada a um complexo sistema que pode ser denominado como Nexo Estado-Finanças, que envolvem mecanismos bancários, tais como empréstimos, riscos, seguros, etc... Alguns teóricos mencionam, como um setor econômico denominado pela sigla em inglês Fire (finances, insurance, and real estate), finanças, seguro e imóveis, que criaram uma lógica própria no nosso mundo contemporâneo. A complexidade do sistema financeiro internacional é hoje um fato no mundo todo, e as suas estruturas controlam e ditam posturas governamentais, sem muita consulta aos cidadãos em qualquer país do mundo. Os financistas conseguiram construir uma cortina de fumaça desinformadora, que compartilha falsas verdades, como por exemplo, a de que o ajuste fiscal é fundamental para a saúde econômica de qualquer nação.

Segundo estudo desenvolvido pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA), pelos pesquisadores Fabíola Vieira e Rodrigo Benevides em 2013, a despesa com saúde per capita do Brasil foi de US$591,00/habitante, quase metade do gasto Argentino, US$1.167,00/habitante, e um sétimo do Americano US$4.307,00/habitante. No campo da educação, segundo o IBGE com relação ao grau de analfabetismo, passamos em 2000 de 13,63% de analfabetos com mais de quinze anos de idade, para 9,6% em 2010, e 8,4% em 2014, o que significou um grande avanço nessa área. Ainda segundo o IBGE, o Brasil passou a ter em 2006, 97% de suas crianças de 7 a 14 anos frequentando uma escola. Apesar disso, a imprensa nacional e grande parte de seus analistas apontam a absoluta necessidade de aprovação do teto fiscal, a Proposta de Emenda Constitucional, PEC241, que congela os gastos com saúde, educação e investimentos públicos por 20 anos. Os argumentos de forma absurda e irracional chegam a apontar que esse ajuste atende inclusive as necessidades das classes menos favorecidas. Mais uma vez fica claro, que há um ajuste de longo prazo em curso no sistema capitalista internacional, que abandonou uma dimensão produtiva e desenvolvimentista, para uma rentista e de acumulação flexível. Esse ajuste começa a ser instalado, ao final da década de setenta do século XX, quando se presencia o declínio das políticas social-democratas e a emergência da desregulamentação neo-liberal, que enfatiza a necessidade da redução da carga tributária a qualquer custo. As Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs), também possibilitaram um incrível incremento dos fluxos de capital pelo mundo, que deixaram de ser fiscalizados, e portanto taxados pelos Estados Nacionais. E, quem manifesta uma opinião similar nesse assunto é o economista Joseph E. Stglitz, que foi assessor de Bill Clinton e economista chefe do Banco Mundial, sem portanto qualquer ligação com o campo do marxismo;

"Algumas das inovações mais importantes nos negócios no últimos trinta anos se concentraram não em como tornar a economia mais eficaz, mas em como garantir o poder de monopólio e contornar as regulamentações governamentais que pretendiam alinhar benefícios sociais e retornos privados." STIGLITZ 2007 página46

Aqui fica claro como a economia no mundo todo tendeu para a desregulamentação, livrando os capitalistas da taxação de impostos, gerando uma clara casta de financistas que são os principais beneficiários, e impondo ao cidadão comum um pesado ônus, seja no corte dos benefícios sociais, ou na sua aposentadoria. Nesse contexto, o Brasil vem se alinhando com essas tendências de forma acrítica, sem avaliar suas particularidades e características próprias. O país demanda investimentos urgentes em infraestrutura urbana, inclusive para melhorar sua performance em educação e saúde da sua população. Essa infraestrutura, que demanda recursos públicos é fundamental para requalificar as cidades brasileiras, tornando-as instrumentos de inclusão social e de distribuição de oportunidades de forma mais equânime, não podendo ser canalizadas para os interesses rentistas de uma minoria, que vem limitando o debate.

BIBLIOGRAFIA:
STIGLITZ, Joseph E. - Globalização como dar certo - Companhia das Letras São Paulo 2007
http://www.revistaforum.com.br/mariafro/2016/10/03/ipea-os-impactos-do-novo-regime-fiscal-para-o-financiamento-do-sistema-unico-de-saude-e-para-a-efetivacao-do-direito-a-saude-no-brasil/