quinta-feira, 6 de maio de 2021

A projetação, especulação e a atual hegemonia financeira


A projetação e a previsibilidade são atividades em crise em nossa sociedade contemporânea, pela progressiva expansão da lógica financeira e neoliberal nos comportamentos cotidianos das pessoas, instituições, governos e empresas. Entende-se aqui, projetação como um conjunto de eleições, operações e valorações críticas necessárias para a transformação de uma realidade espacial que envolvem; informação conhecimento e criatividade. A projetação se insere dentro de um âmbito muito maior, que é a previsibilidade, que na verdade é uma pretensão humana, que com a modernidade se expandiu grandemente, mas ainda não se generalizou. Nesse contexto, emergem de forma contínua, e cada vez mais instável, demandas; comportamentais, políticas, administrativas, sociais e empresariais, que muitas vezes multiplicam a escala da projetação, em dimensões da ordem; do global, do território, da cidade e do local. Há uma contínua geração de perplexidades, que interrompem ou apresentam descontinuidades do processo de projetação, que deve ser contínuo, ou o fragmentam entre criação/ imaginação e conhecimento/ informação. Aqui, continuidade e integridade no processo de projetação envolve o desenvolvimento de um pensamento específico, que observa e tem consciência de "seu sentido", do processo em sua totalidade, desde as demandas iniciais, até a materialização das transformações e sua adequação ou apropriação ao cotidiano de uso e operação(1). Essa continuidade e integridade, não significa uma ação estabelecida e comportada, mas insegura e disposta a disparar a emergência de demandas e desejos inesperados. O processo de projeto, quando sincero, não é algo aprisionado a uma sucessão comportada de etapas, mas que reconhece a sua imensa possibilidade de fazer disparar arranjos utópicos inesperados. Quando iniciado, os agentes envolvidos na verdadeira projetação não sabem, aonde irão chegar. No processo invariavelmente, as dimensões comportamentais, políticas, administrativas, sociais e empresariais são questionadas e problematizadas pelo exercício de pensar uma outra configuração espacial. Na projetação, nenhuma comprovação espacial ou organizacional é aceita sem questionamentos da própria operação da vida, apesar da pretensa objetivação interessada do Poder, que invariavelmente defende a manutenção do módus operandi existente.

"Desde este ponto de vista, o primeiro objeto da investigação arquitetônica da projetação parece consistir em encontrar e abarcar os instrumentos adequados para resolver os problemas da cidade, integrando-os com a realidade territorial, e isto com o fim de configurar, para a cidade e o território, critérios específicos de desenvolvimento em termos formais." SAMONÁ 1971 página 165 Tradução minha do espanhol 


O "sentido" do processo é o conceito central, sua intenção é a transformação espacial da habitação da cidade e do território, mas comandada e conscientemente direcionada por quem? Pelo Poder instituído? Pelo empresariamento das vidas? Ou, pelas populações atingidas? A projetação é uma forma de interpretar o real ou o contexto, não de uma forma descritiva, mas prescritiva, se arriscando num ato criativo, elegendo tecnologias, funcionalidades e figurações expressivas. Um processo complexo que envolve conhecimento, criatividade e operacionalidade, todos competindo para a concepção de uma transformação espacial e territorial, de uma obra. Uma forma de conhecimento, que está em algum lugar nos confins entre a teoria e a operatividade, entre o canônico e o empírico, entre a história e a antihistória, que avalia a eleição de âmbitos possíveis de novos problemas, novos juízos de valores, e novas abordagens, num tênue limite entre pragmatismo e utopia. Um momento de cognição coletiva, envolvendo projetista e demandante, que é também ciência e criação, que faz um inquérito aos usos e costumes, às tecnologias adotadas, e às demandas figurativas desejadas ou construídas, que impulsiona os participantes para um lugar, aonde o que está em jogo é a construção do mundo. Há uma clara identificação de arte e ciência, impulsionada e composta por uma fase indutiva, baseada no apriori universal dos cânones, mas também dedutiva, baseada na observação analítica dos fatos e da natureza, tal como operam no contexto. Talvez daí decorra, a inerente pretensão dos arquitetos e urbanistas, que lidam com o "gigantismo da utopia", e da necessidade de uma constante vigilância escalar, que modula a esfera da intervenção local, vizinhança, urbana, metropolitana ou territorial. 

"A realização física da metrópole contemporânea (do território) em quantidade e qualidade requer novos meios de intervenção. Se trata de interpretar ao individual para permitir-lhe fazer se partícipe de organizações renovadas, mas sem seguir a falsa lógica dos gigantesco parâmetros através dos quais a organização e a complexidade dos fenômenos impelem a criação de espaços cada vez mais amplos até levar-nos - a nós arquitetos - à utopia do gigantismo. A qual, na impossibilidade de ser controlada com os instrumentos usuais e de expressar unitariamente este complexo de relações dinâmicas é - sempre por nós arquitetos - , graduada em sucessivos modos e momentos de intervenção na cidade e no território." SAMONÁ 1971 página 163, Tradução minha do espanhol

Rem Koolhaas já mencionou a trágica condenação dos arquitetos no mundo contemporâneo, em seu caminhar bipolar, entre a pretensão absoluta e a mais profunda depressão, exatamente pela megalomania, que todo esse processo perpassa. Há na contemporaneidade, dominada pelos comportamentos financeiros, uma contínua ampliação e conspiração da abstração do valor não desfrutado no presente, mas de olho num incremento prometido, localizado no futuro. A renda fundiária na grande metrópole contemporânea, em si mesmo abstrata, no sentido de que seu território não é apreensível, também fomenta flutuações que transferem rendas da população em geral, para poucos proprietários. Pois, as motivações subjetivo-psicológicas convergentes e aleatórias se movimentam de forma completamente desproporcional em relação aos fatores objetivos, sendo sempre dominada por aqueles que desfrutam da propriedade em estoque ou monopólio. Os projetistas e toda a sociedade parecem capturados pela lógica financeira, que claramente desfruta de claras analogias com a especulação e o empreendedorismo imobiliário. Não mais uma civilização do consumo ou do estilo, mas um lugar no qual os dois são intercambiáveis, assim como o sublime do modernismo e o belo do pós-modernismo nos trazem a impressão do Fim da História (2). As novas Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs), também desempenham um papel ampliador da abstração no campo da projetação, uma vez que distanciaram os profissionais da realização efetiva das obras. A representação e o desenho tenderam a se autonomizar como campo semi-autônomo. A produção de uma realidade virtual, não construída passou a desempenhar nos cursos de Arquitetura e Urbanismo uma sedução irresistível para as novas gerações, absolutizando a representação da construção, transformando desenhos em restituições-simulacros tão convincentes, quanto fotos do real.

"Em relação ao dinheiro e à terra, bem, esses são precisamente os fenômenos que nos preocupam aqui e que nos permitirão testar a utilidade do conceito de mediação e aquela ideia relacionada a ela, o nível ou campo semi-autônomo. É importante compreender antes de tudo que nem o dinheiro nem a terra podem em si se constituir tal nível, pois ambos são claramente elementos funcionais no interior daquele sistema ou subsistema mais fundamental, que é o mercado e a economia. " JAMESON 2001 página176

Todo esse mundo, aonde conhecimento e tecnologia sofreram desenvolvimentos expressivos nos levam  a uma dialética de identidade e diferença, ou permanência e mudança, aonde fica a impressão de que algo mudou para tudo permanecer o mesmo. De um lado, uma crença conservadora na afirmação de uma nova sociedade pós- industrial, baseada numa ordem social na qual as dinâmicas clássicas do capitalismo foram substituídas pela primazia da ciência e da tecnologia, explicando a suposta mudança da produção para uma economia de serviço (3). Ou a nova economia verde, que promete um alinhamento ético do capitalismo, que domesticaria a imensa vontade de lucro no curto prazo por uma consciência do vir-a-ser das futuras gerações. Essas versões investem fortemente no fim das ideologias e proclamam uma dimensão técnica e positivista do desenvolvimento, que na verdade era fruto de um planejamento estruturado, típico do keynesianismo, que então, já entrava em declínio. De outro lado, há uma visão inovadora, mais progressista e pouco notada e citada, mas de grande perspicácia na interpretação do nosso tempo, mostrando a partir de argumentos históricos convincentes, a recorrência cíclica do sistema capitalista. A visão aqui mencionada é o livro de ARRIGHI, Giovanni, já comentado aqui no blog, O Longo Século XX, dinheiro, poder e as origens do nosso tempo de 1994, com tradução no Brasil em 1996. A argumentação de ARRIGHI 1996 era de que havia uma recorrência histórica no próprio capital, em três estágios repetidos, que se travestiam de falsos arranques ou recomeços, em escala cada vez mais ampla no planeta. O primeiro estágio era a implantação, numa região nova tendo sempre uma ligação com o comércio e a circulação de mercadorias, e usando da violência e brutalidade típicas da acumulação primitiva. O segundo estágio era o desenvolvimento produtivo da região, articulando manufaturas, indústrias e agricultura num centro de desenvolvimento, que por uma lógica de saturação dos mercados anunciava o declínio dos lucros. Por fim, o terceiro estágio que era a desterritorialização do capital, que para se defender das taxas declinantes do lucro, migrava abandonando suas fábricas e força de trabalho treinada para formas especulativas do mercado do dinheiro ou da terra, que garantiam aventuras mais lucrativas descasadas da produção real. Há nessa construção, uma clara referência ao historiador Fernand Braudel da Escola dos Anais de França, que pontuava na sua história do Mediterrâneo; "o estágio da expansão financeira é sempre um sinal de outono".  Era esse o traço estável e recorrente do desenvolvimento do capital, desde as Cidades Estado italianas, passeando na história das finanças por bases territoriais como; a Itália das Cidades Estados, as cidades da Liga Hanseática no século XVI e XVII, a Inglaterra do século XVIII e XIX, até se instalar nos EUA no final do século XIX. A mudança da potência hegemônica das altas finanças era sempre anunciada pela emergência de atividades especulativas incontroladas, pela própria natureza do dinheiro.

"Parece-me que esses trechos podem ser lidos como uma reafirmação da fórmula geral de Karl Marx para o capital: D-M-D´. O capital-dinheiro (D) significa liquidez, flexibilidade e liberdade de escolha. O capital-mercadoria (M) é o capital investido numa dada combinação de insumo-produto, visando ao lucro; portanto, significa concretude, rigidez e  um estreitamento ou fechamento das opções. (D´) representa a ampliação da liquidez, da flexibilidade e da liberdade de escolha... A fórmula também nos diz que, quando os agentes capitalistas não têm expectativa de aumentar sua própria liberdade de escolha, ou quando essa expectativa  é sistematicamente frustrada, o capital tende a retornar a formas mais flexíveis de investimento - acima de tudo, à sua forma monetária. Em outras palavras, os agentes capitalistas passam a "preferir" a liquidez, e uma parcela incomumente grande de seus recursos tende a permanecer sob forma líquida." ARRIGHI 1996 página5

Daí a confusão recorrente nos tempos atuais entre qualidade da projetação e gentrificação, ou a restrição do plano e do projeto ao âmbito processual, negando sua condição de produto, que de certa forma angustia o campo desde a década de setenta. O falso dualismo entre processo e produto perpassa a construção de ALEXANDER, Christopher, tanto em Urbanismo y Participación, como em El Modo intemporal de construir e El linguagen de patterns. Livros e reflexões, do final da década de setenta, que além da nostálgica celebração do longo tempo de estratificação das tecnologias na Idade Média, traziam para a superfície a resistência da projetação como tarefas essencialmente de longa maturação temporal. Longa maturação incompatível com a ansiosa pressa e ansiedade do capital financeiro e especulativo contemporâneo, que passou a realizar de forma quase momentânea lucros exorbitantes e abstratos, aonde o conjunto da sociedade é submetida ao regime de responsabilidade fiscal, enquanto o capital é cada vez mais especulativo. A doutrina da responsabilidade fiscal é incontornável e inquestionável no Brasil, que se recusa a problematizá-la, repetindo ad infinito que o Estado não pode gastar mais do que arrecada. Na verdade, essa doutrina não encontra nos meios de comunicação de massa no país, nenhuma voz que relativize e problematize sua absolutização, como um dogma incontornável, uma afirmação peremptória. Um claro sintoma da hegemonia financeira, que nos governa, que se recusa a reconhecer alternativas de ordenação social, fora da competição e da precificação de tudo, que nega as formas de operação colaborativas e solidárias.

"... as necessidades e aspirações dos mercados, esse megacidadão informe e monstruoso que nunca ninguém viu nem tocou nem cheirou, um cidadão estranho que só tem direitos e nenhuma dever. É como se a luz que ele projeta nos cegasse" SANTOS 2021 página28

Três parâmetros balizam a lógica neoliberal, que vem se expandindo no nosso mundo contemporâneo, desde o final da década de setenta e início da de oitenta, sem enfrentar uma contraposição clara e objetiva, que lhe confronte uma outra racionalidade mais convincente. Em primeiro lugar, ao contrário do que apontavam os pensadores neo clássicos, o mercado não é um acontecimento natural, mas algo construído e regulado pelo Estado, que lhe confere uma estrutura legal. Em segundo lugar, a própria essência da ordem mercado não é a troca, mas o empresariamento de suas ações. E, por último a expansão contínua da universalização da norma da concorrência entre os indivíduos, gerando o que alguns autores denominam do sujeito-empresa, capaz de se lançar na disputa acirrada contra tudo e todos para obter seu sustento. Eles estão centrados na expansão, generalização e absolutização da concorrência como um valor em si, em todos os extratos dos mundos da vida, em seu cotidiano e em suas práticas diárias. Tudo isso acaba determinando uma confusão interessada entre esferas privadas e públicas, embaralhando os espaços de suas atuações, colocando em dúvida os campos do direito e da produtividade, do ético, da projetação e da previsibilidade e do econômico. Afinal, saúde, educação e habitação são direitos que todos devem ter acesso, ou mercadorias produzidas segundo uma ética concorrencial, sem qualquer resquício de solidariedade? A predominância do direito público sobre o direito privado, que parecia ser um consenso no mundo do pós-guerra entre 1945 e meados da década de setenta, entra em crise com a doutrinação neoliberal, que inverte sobrepondo o direito privado a tudo.

"Da construção do mercado à concorrência como norma dessa construção, da concorrência como norma dos agentes econômicos à concorrência como norma da construção do Estado e de sua ação e, por fim, da concorrência como norma do Estado-empresa à concorrência como norma da conduta do sujeito-empresa, essas são as etapas pelas quais se realiza a extensão da racionalidade mercantil a todas as esferas da existência humana e que fazem da razão neoliberal uma verdadeira razão-mundo." DARDOT e LAVAL 2016 Pág.379

Essa absolutização da concorrência ao final é seletiva deixando de fora uma série de custos não contabilizados; custos sociais e ecológicos que passam a ser cobertos pelo conjunto da sociedade, que arca com eles. A expressão de Thatcher, de que não há refeição grátis, envolve uma redução simplificadora na definição capitalista do valor, que restringe sua concepção às posses lucrativas e a esfera de responsabilidade da propriedade. Afinal, os custos sociais e éticos de deixarmos pessoas morrer por inanição é imenso. Foi William Kapp, amigo de Karl Polanyi do livro A Grande Transformação; as origens da nossa época, que escreveu ainda em 1950, The Social Costs of Private Enterprise, uma crítica ecológica do desenvolvimento capitalista. No qual, lembrava que a definição capitalista de valor dependia de uma divisão fundamental entre o que seria ou não levado em conta, que ao se restringir a esfera de responsabilidade da propriedade privada, só contabiliza os custos econômicos, deixando de fora os sociais e ecológicos. Foi a implantação do novo sistema industrial, no início do século XIX, que deixou fora da contabilidade da produção ítens como; transporte, moradia, educação, aposentadoria, enterro, doença cuidado com os órfãos dos trabalhadores, impactos no meio ambiente, no ar, na água, etc... De certa forma, a história política do século XIX e XX pode ser contada pelo conjunto de externalidades sociais e ambientais, que a empresa suprimiu de sua contabilidade, e que grupos variados tentaram fazer a sua reinserção.

"O capital se beneficia de um conjunto de externalidades positivas das quais financia apenas uma fração. Além disso, em seu ambiente social e natural, ele se liberta de um conjunto de negatividades cujo fardo é suportado por outros, humanos e não humanos. É somente sob a condição oculta dessa dupla isenção dos custos reais da produção que ele pode se apresentar como economicamente beneficiário. O capitalismo é uma economia do despejamento." CHAMAYOU 2020 página 272 

A própria mercadoria, que tanto fascinou Karl Marx, e que foi utilizada como ponto de partida para sua reflexão maior era considerada como; valor de uso, valor de troca e fruto do trabalho humano, mas acima de tudo como potencialidade e contradição da forma-mercadoria. As mercadorias são diversificadas, podem ser trigo ou lã, mas existe um princípio de equivalência entre duas coisas distintas que as homogeniza numa base, que pode ser sal, concha ou dólar. O dinheiro é uma invenção muito antiga, que segundo POLANYI 2000, nas sociedades pré capitalistas era mais usado para transações extra comunidade e raramente intra comunidade. Para POLANYI 2000, o mercado inicia uma grande expansão ampliando sua cobertura sobre várias esferas, no entanto os campos do trabalho, da terra, e do dinheiro sempre foram pontos aonde a contradição se manifestava de forma mais intensa, afinal esses três ramos não eram mercadorias efetivamente produzidas, mas fortes acasos as atravessavam. O trabalho, que envolve a qualificação pessoal de cada um de nós era fruto de uma vivência complexa, que abarcava experiência muito diversificadas de diferentes atores e agentes, difíceis de serem homogeneizadas pela moeda. A terra, a superfície do planeta acumulava benfeitorias em que mais acasos que o próprio trabalho, que tornavam sua valorização ainda mais diferenciada com relação a sua realidade locacional, que também era perpassada por acasos, e não por algo produzido. Por último, o dinheiro, um meio que se transforma num fim em si mesmo, sua transformação em mercadoria agrega a ela valores absolutamente simbólicos ligados ao exercício do poder. Afinal, a maior procura contemporânea pelo dólar espelha apenas a dominação militar e econômica dos EUA? Ou sua vitalidade econômica, agora não mais produtiva, mas cada vez mais especulativa? Um desses universos possui forte conexão com o campo da projetação da habitação, do urbano e do território, por razões óbvias; a terra. Um outro, o trabalho, e particularmente por suas especificidades, o trabalho de projetação, é muito difícil de ser dimensionado e portanto valorado, uma vez que a processualidade é aberta, e invariavelmente dispara demandas e desejos de ordem; comportamentais, políticas, administrativas, sociais e empresariais inesperados no processo.

Na verdade, a forma como o neo liberalismo se expande pelo mundo, conquistando mentalidades e espíritos é sempre usando de tecnologia política contra o mundo do trabalho, a auto-gestão, a natureza, e por fim a própria política. Mas, diante desse cenário, qual o programa arquitetônico, urbanístico e territorial do nosso tempo contemporâneo, capaz de colocar essas formas de operação em dúvida ou suspensão? A produção de equidade. Habitação, Cidade e Território precisam passar a ter como premissa de desenho e formulação, a distribuição de recursos e oportunidades de forma mais equânime, sem as tendências concentradoras, as quais o capitalismo nos condicionou. A previsibilidade e a projetação efetiva e contínuamente ampliada para todos, podem colocar em cheque o neoliberalismo dominante.

NOTAS:

(1) O ideal de etapas conscientemente controladas do projeto envolve; elaboração do programa, concepção geral e ideia preliminar, anteprojeto, projeto executivo, orçamentação e detalhamento, acompanhamento de obra e acompanhamento da ocupação e da operação.

(2) A menção aqui é a FUKUYAMA, Francis - O fim da História - Editôra Rocco Rio de Janeiro 1992. e a um ensaio brilhante de JAMESON denominado - Fim da Arte ou Fim da História - no livro A cultura do Dinheiro, no qual o autor volta a Hegel e ao seu absoluto, que proclamava o fim da arte, ou sua diluição na filosofia. O que me remete a necessidade impositiva do capitalismo da necessidade de expansão geográfica de seus domínios para reforçar sua existência.

(3) Os livros recorrentemente citados dessa visão conservadora são de BELL, Daniel (1919 - 2011), respectivamente; O fim da ideologia (1960), O Advento da sociedade pós-industrial (1973) e As contradições culturais do capitalismo (1976), que de certa forma anunciam a era Reagan e Thatcher ao final da década de setenta e início dos oitenta.

BIBLIOGRAFIA:

CHAMAYOU, Grégoire - A sociedade ingovernável; uma genealogia do liberalismo autoritário - Ubu Editora São Paulo 2020

DARDOT, Pierre e LAVAL, Christian - A nova razão do mundo, ensaio sobre a sociedade neoliberal - Editora Boitempo São Paulo 2016

JAMESON, Frederic - A cultura do Dinheiro, nos ensaios Cultura e Capital Financeiro e O tijolo e o balão: arquitetura, idealismo e especulação imobiliária - Editora Vozes Petrópolis 2001

KOOLHAAS, Rem - Delirious of New York - The Monacelli Press New York 1994

KAPP, Karl William - The Social Costs of the Business Enterprise - Cambridge Harvard University Press 1950

POLANYI, Karl - A grande transformação; as origens do nossa época - Elsevier Rio de Janeiro 2000

SAMONÁ, Alberto et all - Los Problemas de proyectación para la ciudad, las escalas de proyectación y unidad de método - Editoria Gustavo Gilli Barcelona 1971

SANTOS, Boaventura de Souza - O futuro começa agora - Editora Boitempo São Paulo 2021

TAFURI, Manfredo, et all - Curso de teoria de la proyectación arquitectónica - Editorial Gustavo Gilli 1971