terça-feira, 27 de setembro de 2016

Quando acaba ou se dá por acabado?

Mais uma vez volto ao tema do desenho. Abstrato? Será? Ou simples devaneio, diante de uma nova caixa de Crayola. Linhas, pontos, cortes, planos, módulos, partidas e chegadas. Acabei nomeando-o; foice e ponto, por mera solicitação de salvamento do computador. Podia também ser; ponta e curso, para compreensão dos referenciais e o processo de promoção de suas conexões direcionadas. Pontos cheios, pontos vazios, e eixos de conexão cansada.

Um desenho sempre começa, mas nunca sabe aonde acaba. Mais um traço ou um tema, e o papel não comporta mais, foi tudo perdido. Quando acabar, ou dá-lo por acabado?

Isso tudo me lembra um velho poema de Paulo Mendes Campos, sobre Paris, na verdade seu nome é;

POEMA DE PARIS

Sopravam ventos largos sobre a rua
Que vai de meu hotel até meu bar.
Mais longe, além do bar, surgiu a lua
Vulgar e trsite sobre o boulevar.
Vous êtes triste? - perguntou-me nua
Uma sueca com que fui amar.
Triste de uma tristeza como a tua,
Como a lua no céu, triste e vulgar.
Sobre os Campos Elísios, cor de vinho
Chegava a madrugada... e seu carinho
Fez do luar, luar de Apollinaire -
Além do bar, da lua, da mulher.

segunda-feira, 19 de setembro de 2016

Texto na revista Projeto debate os modelos de cidade

A última revista Projeto traz um texto meu, Cidades precisam de mais projetos, que debate o modelo que a cidade brasileira vem seguindo para promover sua expansão interminável sobre o território natural que as cercam, um referencial baseado na cidade americana. Estruturado por áreas habitacionais de baixa densidade, uni funcionais portanto sem a presença de comércio e escritórios, e com benfeitorias exclusivas tipo condomínio clube, dependentes do automóvel particular ou de modais de transporte de baixa capacidade e baseado no pneu, e com centros de negócios dominados por escritórios comerciais, que por essa condição sub aproveitam as infraestruturas instaladas. Essa discussão sobre a cidade, ou esse modelo, ou sobre seu vir-a-ser não consegue entrar na pauta de nossos candidatos a prefeito, pois esses não explicitam o referencial que deveriam perseguir com seus governos. Essa ausência acaba fazendo com que suas futuras administrações se tornem reféns de lógicas de grupos de interesses específicos, que acabam sequestrando suas diversas propostas para essa continuidade desse modelo hegemônico de fazer cidade. Há uma naturalização dessa forma de viver e de conviver em nossas cidades, como se esse processo não fosse fruto de escolhas muito claras e objetivas.

O texto portanto, tenta lançar luz sobre essa prática, apontando a necessidade de elaboração de planos e projetos contra-hegemônicos a esse modelo de cidade, de forma que o seu vir-a-ser possa ser escolhido pelo interesse público maior.

sábado, 17 de setembro de 2016

Arquiteto Gustavo Restrepo da Colômbia faz discurso convincente em Manaus

Escadas rolantes em San Xavier Medellin*
A abertura do encontro do IAB nacional do II Congresso Internacional de Arquitetura e Sustentabilidade na Amazônia (IIArqamazônia), em Manaus foi feita pelo arquiteto colombiano Gustavo Adolfo Restrepo, trazendo um discurso convincente sobre a construção do ambiente humano, principalmente para as aglomerações brasileiras. Restrepo concentrou sua palestra sobre a questão da mobilidade urbana em nossas cidades, afirmando que a obtenção de melhores performances nessa área, garantem melhor qualidade de vida, ampliação significativa da auto-estima das pessoas, e incremento da sensação de pertencimento a um lugar. A receita de Restrepo serve como uma luva para o Brasil, segundo ele; planejamento continuado, participação social, uso intensivo de concursos públicos de projeto, e transparência nas montagens das parcerias público-privadas garantem a construção de uma espacialidade reformadora de práticas cotidianas inadequadas, ou seja uma nova cidade. Ainda segundo Restrepo um Estado que não improvise, que tenha um planejamento estruturado podem reverter situações de violência urbana instalada, territórios urbanos dominados pelo tráfico de drogas podem ser resgatados por essas ações.

"O urbanismo pode combater o narcotráfico..O uso arquitetônico permite que a família se empodere, criando lugares de esperança onde antes havia o medo." RESTREPO, 2016

Escadas rolantes em San Xavier Medellin*
O arquiteto destacou que o pilar da questão é a mobilização das pessoas, que com seu engajamento nas transformações geram a sensação de pertencimento inerente a uma cidadania plena, onde a auto-estima é ampliada de forma convincente. A palestra também abordou a necessidade de políticas continuadas de Estado, que transfiram às populações a confiança na reversão de descalabros comportamentais inseridos no cotidiano das comunidades menos favorecidas. O desenvolvimento de índices e parâmetros capazes de medir de forma sintética a evolução da qualidade de vida urbana são importantes para o monitoramento dos planos. Enfim, planejamento e participação são elementos fundamentais da gestão da cidade, pois constroem uma integração progressiva de comunidades excluídas.

"A chave é planejar para não improvisar. Não podemos fazer nada se a cada quatro anos se quer mudar tudo... Os cidadãos têm que fazer observatórios para acompanhar as políticas, com dados e informações”

Na verdade, o arquiteto apresentou as importantes transformações dos últimos anos, que a cidade de Medellin vem sofrendo, e que nas décadas de oitenta e noventa mostrava  um cenário de degradação e de ampliação do domínio do Cartel de Medellin, passando a ser modelo de construção de políticas públicas para o combate da violência urbana. O traficante Pablo Escobar chegou a ser eleito deputado federal, tendo sua posse acompanhada pelo então primeiro ministro espanhol, Felipe Gonzales, com uma clara demonstração de poder da economia do tráfico de drogas.

Importante salientar que na década de noventa, gestores públicos e arquitetos de Medellin visitaram a cidade do Rio de Janeiro, que então estava engajada no programa Favela Bairro, de urbanização de comunidades carentes. Um programa que chegou a ser reconhecido pelo Banco Mundial e pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), como uma política notável na promoção da inclusão social. Naquela época os colombianos buscavam sintetizar uma política, que sinalizasse com um maior controle das áreas informais da cidade, os arquitetos colombianos então souberam desenhar uma política, que enfrentasse o problema da ocupação espacial. Se apropriaram de uma política para as áreas informais, dando um passo adiante, nos programas de urbanização de favelas, agregando a eles uma atitude mais sistêmica, referenciada aos modais de transportes e a uma melhor condição de mobilidade.

O arquiteto Gustavo Restrepo demonstrou que uma política urbana estruturada, que articula diversas questões do cotidiano espacial de nossas cidades, que promove o planejamento como ação do Estado, e que elege os concursos públicos de projeto como a forma mais democrática de definir a relevância de uma obra pública podem ser um importante fator para alcançar transformações sociais e um urbanismo sustentável. A qualidade da arquitetura e do ambiente espacial de nossas cidades são fatores fundamentais para a construção de uma cidadania consciente.

NOTAS:
As fotos são de Roberto Ghione, publicadas no texto do site Vitruvius Transformação social e urbanística de Medellin, acessível no link abaixo

http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/14.166/5177

sexta-feira, 16 de setembro de 2016

Jürgen Habermas, Para a reconstrução do materialismo histórico

O livro do filósofo alemão Jürgen Habermas, Para a reconstrução do materialismo histórico, é uma das mais importantes reflexões sobre o nosso mundo contemporâneo, composto por uma reunião de textos diferenciados escritos ao longo da década de setenta, que precedem sua importante obra escrita em 1981, Teoria da ação comunicativa. O tema central do livro são os sintomas da evolução social, sejam evolutivos ou regressivos, que para Habermas em seu sentido progressista significa a ampliação de formas de vida mais democráticas e emancipadas. Dentro das quais a linguagem, o trabalho e a comunicação são especificidades humanas, que impulsionam aquilo que o filósofo alemão considera como fundamental na vida social, a capacidade de aprendizagem. Essa na verdade, não possui um sentido teleológico, mas necessita e demanda da humanidade uma constante reflexão, viabilizada pelo conflito e o embate de visões dentro da ação comunicativa.

Habermas rediscute os conceitos de Marx, na sua categorização da infraestrutura e superestrutura, negando-se a considerar o condicionamento do desenvolvimento social apenas por sua base produtiva e material, o economicismo. E, também os conceitos de Max Weber relativos a racionalidade instrumental e ao desencantamento do mundo promovidos pela modernidade, que talvez só possam ser resignificados pela disposição didática ou vontade de aprendizagem. O livro esta subdividido em quatro secções; a primeira Perspectivas filosóficas, seguida de Identidade, depois Evolução, e por último Legitimação, agrupando textos de diferentes motivações. Dois deles, Desenvolvimento moral e identidade do Eu, e Sociedades complexas podem formar uma identidade racional?, que estão na segunda secção, Identidade, e que foram escritos em 1974, o primeiro em função das comemorações do jubileu de cinqüenta anos da Escola de Frankfurt, e o segundo por ocasião da concessão do Prêmio Hegel da cidade de Stuttgart. Os dois fazem analogias entre o desenvolvimento cognitivo do indivíduo, e os complexos processos da estruturação social. A conquista do domínio da linguagem e da comunicação pelo indivíduo são comparados com a consolidação de instituições associativas e representativas, que implicam no desenvolvimento de um discurso ou narrativa persuasiva e convincente de diversificados interesses. A ideia está ancorada na maioridade kantiana, do indivíduo consciente de suas ações e posicionamentos, tanto que o estágio mais desenvolvido considerado por Habermas, da identidade seria a da sua vinculação com o ser cosmopolita e universalista.

"Pois segundo normas que precisam ser justificadas universalmente, determinados grupos não podem mais se privilegiar em razão de uma força formadora de identidade (como família, cidade, Estado ou nação)...De maneira correspondente, a identidade política (staatbürgerlich) ou nacional deveria ser ampliada para uma identidade cosmopolita (weltbürgerlich) ou universal." HABERMAS 2016, página140

Seriam os sinais de um mundo multipolar, onde não há mais uma nação hegemônica, onde todas as nações se sentissem igualmente niveladas? Sem dúvida, são apenas sinais, ainda incapazes de representar uma prática efetiva entre as nações, mas o que me parece importante nessa teoria nascente de Habermas é sua explicitação não como uma conformação objetiva, mas que aceita o divagar inerente ao didatismo. Enfim, processos didáticos de aprendizagem são auto constitutivos de identidades, que podem se referir ao indivíduo ou a instituições coletivas de associação de pessoas, como órgãos de categorias, cidades, estados e nações.

As proposições de Habermas retomam de certa forma a construção de uma perspectiva histórica e utópica para a humanidade, no entanto, seu investimento num gradualismo e didatismo nos alertam que o objetivo jamais será integralmente atingido. A demanda é por construção contínua, aprendizagem e aperfeiçoamento podem ser progressistas ou regressivas, que ao final significam vigilância interminável.

BIBLIOGRAFIA:

HABERMAS, Jürgen - Para a reconstrução do materialismo histórico - Editora Unesp 2016 São Paulo

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

O filme Aquarius e a cultura brasileira do bem viver

O edifício Aquarius do filme, tres andares de altura
O filme Aquarius vem conseguindo mobilizar uma quantidade excepcional de público, que invariavelmente se manifesta ao final da projeção, com pedidos de Fora Temer, que relembram as manifestações dos atores e da direção no último Festival de Cannes, quando abriram cartazes manifestando-se contra o golpe de estado, que então estava em curso, da presidente Dilma Roussef. Mas além dessas questões políticas importantes, o filme na verdade se concentra na discussão da opção cultural, que o país realizou com relação a construção de suas cidades, e o seu modelo cultural do bem viver. Afinal a câmera obessivamente detalha para a sua audiência uma maneira que acabou caindo em desuso em nossos empreendimentos imobiliários em nossas cidades, o edifício multifamiliar sem elevador, e portanto de baixo gabarito, que na verdade assume uma relação com o espaço público da rua muito mais amigável, que as enormes torres em altura. Hoje esse desenvolvimento em torre passou a ser o padrão do bem viver no Brasil, não existindo mais o empreendimento de pequena escala, que caracteriza o Edifício Aquarius.

No filme, essa forma de habitar arcaica é constantemente desdenhada pela familia de Clara, a personagem de Sonia Braga, como insegura, inadequada e ultrapassada pelos modernos empreendimentos das torres em altura, que povoaram a praia de Boa Viagem e o Brasil de maneira tão agressiva e especulativa. Invariavelmente, nossas frentes marítimas ou nossos bairros mais valorizados passaram a receber essas imensas torres isoladas, que acabaram por representar o padrão do bem viver de nossas elites endinheiradas. Além de seu desenvolvimento em altura excessiva, a estrutura funcional alardeada é a do condomínio clube isolado da urbanidade, que passa a representar o controle da exclusividade para o bem viver nacional. Os impactos sobre a vizinhança e o espaço público adjacente são enormes, determinando uma sensação de insegurança na rua, que também foi potencializado pelo rodoviarismo dominante.

Edifício no bairro de Botafogo na rua 19 Fevereiro
Importante registrar que as imensas torres com desenvolvimento em altura condicionam uma forma de promoção do adensamento imobiliário, que acaba dominada por grupos de empreendedores monopolistas, que não admitem mais o pequeno investidor, que promoviam nos anos cinquenta e sessenta uma infinidade de condomínios como o Edifício Aquarius nas cidades brasileiras. Basta circularmos por nossas metrópoles para constatar a presença de uma série de edifícios com as mesmas características do Edifício Aquarius, que também foram gerados pelo adensamento urbano. Isto é, nasceram também do lucro imobiliário e da intensificação do uso do solo urbano, que substituiu unidades unifamiliares por unidades de apartamentos, mas sobre a lógica de outra escala de investimento e de produção. O filme retrata de forma emblemática essa nova forma de fazer negócio, hiper especulativa e agressiva, por que promovida por grupos de negócios, que já não encontram concorrentes pois agem de forma monopolista, bloqueando de certa forma a opção de menor escala, que simplesmente não é mais oferecida.

Mas o filme vai além na sua abordagem sobre a situação urbana brasileira, trazendo reflexões importantes sobre a forma como nossas cidades vem se reproduzindo, e gerando um espaço segregado em extratos sociais, com ruas dominadas pelo automóvel e o pneu, condenadas a baixos indices de interação social. Em vários momentos as cenas nos mostram como a geração de Clara, a personagem de Sonia Braga, veneroou e ainda venera o automóvel, seu glamour, sua capacidade de nos transportar fazendo-nos ouvir boa música. Já nas cenas iniciais, na reconstrução dos anos sessenta somos confrontados como essas máquinas que violavam até o espaço noturno de nossas praias, num uso arrogante e exclusivista. Mais contemporaneamente a reunião da familia de Clara, mostra-nos como cada um de seus filhos requisita novos carros cada vez mais potentes e com equipamentos sonoros de última geração. Num determinado momento a sobrinha de Clara, procurando nos albuns de fotos antigas da família, pergunta a seu pai, o irmão da protagonista, porque nos anos passados as pessoas tiravam fotos juntas com seus carros? A resposta é que "eles (os carros) naqueles tempos faziam parte da constituição da personalidade dos seus proprietários", dando-lhes características próprias.

Por último, a questão da segregação urbana também está retratada no filme de forma notável. Num passeio pela praia da Boa Viagem, com a visitante carioca, que aliás mora no Largo dos Leões, na Rua Mario Pederneiras, uma rua de escala notável na sua relação entre espaços públicos e privados no Rio de Janeiro, Sonia Braga explica a subdivisão entre o bairro de classe média alta e a favela de Brasília Teimosa. A fronteira, o limite, a cisão entre a classe média próspera e a auto construção da favela, que fornece a mão de obra de porteiros, empregadas domésticas, babás, etc... é a vala negra de esgoto, que corta a areia da praia. A precariedade de nossas infraestruturas mais básicas é o sinal para a mudança do território. Logo após na sequência, mais uma vez aparece a tipologia habitacional e sua interação com a urbanidade, agora no espaço da precariedade, numa festa, um churrasco dada por uma ex empregada de Clara que mora na favela de Brasília Teimosa; a laje, o terraço, o pavimento mais afastado da rua e da viela, também reconstroe essa distância do burburinho inesperado da vida urbana.

Enfim, o filme Edifício Aquarius é uma reflexão importante sobre o processo de construção e reprodução da cidade brasileira, um processo que tende a radicalizar a separação entre espaços privados e públicos, determinados por uma série de costumes e culturas, que vão desde a celebração da intimidade, a negação da surpresa da rua, o culto exacerbado do automóvel particular, a segregação social, e a produção da intimidade entre precariedade ou auto construção e o distanciamento ou alheamento da urbanidade. Ao final o principal protagonista do filme é esse edifício - Aquarius -, que não se alienava da urbanidade.

sábado, 10 de setembro de 2016

Da série desenhos; abstratos?

Há muito desenho compulsivamente sobre todos o temas figurativistas ou abstratos, não importa. O desenho é uma terapia, que administra a ansiedade, a solidão...São um desafio, pois afinal uns acabam outros não, outros ainda não agradam, alguns são guardados. Muitas vezes eles são produzidos enquanto esperamos, ou quando compramos lápis de cor ou crayolas, e não aguentamos mais esperar para usá-los.

Quando escaneio um desenho, como, o ao lado, o computador solicita um nome para o arquivo. Como nomeá-lo? Acabei chamando-o de Dedos, piano e peito. Mas quando nomeamos desaparece a abstração e reaparece a figuração, dando contexto ao que era uma composição de formas, um arranjo de campos de cor em relação as dimensões totais do limite do papel. Apesar disso, acaba permanecendo a abstração, afinal também podia nomeá-lo como a Obesidade voltando a andar.

Nada é gratuito no desenho; linhas, pontos, planos de cor, proporções, encaixes, contrastes. Tudo se resume a um esforço de domínio das proporções do papel branco e vazio. Ao mesmo tempo sua dimensão de exploração e experimentação, nos coloca sempre a possibilidade do abandono, ou passagem para o próximo....

segunda-feira, 5 de setembro de 2016

IAB-RJ promove debate com os candidatos a prefeito

Foto de Cessa Guimaraens, Roberto Anderson, Molon e Pedro
da Luz
Na última quinta feira, dia 01 de setembro de 2016, na sede do Instituto de Arquitetos do Brasil, departamento do Rio de Janeiro (IAB-RJ) foi realizado o primeiro debate com os candidatos a prefeito da cidade, tendo sido entregue duas cartas de compromissos relevantes para os arquitetos e urbanistas. Com a presença de seu vice, Roberto Anderson, também arquiteto, foram debatidas as propostas do candidato Alessandro Molon para o Rio de Janeiro a partir de 2017. A tônica central da apresentação de Molon foi a proposta de construir uma administração transparente, onde todas as decisões do executivo municipal seriam debatidas com o conjunto da população carioca. Certamente uma iniciativa, que deve ser celebrada, uma vez que os governos no Brasil não demonstram muita disposição para a participação popular logo depois de eleitos, se caracterizando por ações discricionárias.

As  duas cartas entregues pelo IAB-RJ ao candidato, que foram assinadas por ele, foram feitas, uma pelo conjunto das entidades nacionais de arquitetura e urbanismo e outra pelo Conselho Estadual do IAB-RJ. Na primeira carta, o IAB e as entidades nacionais de arquitetura e urbanismo solicitam aos candidatos, que se comprometam com o planejamento das cidades como função do Estado, e com licitações de obras a partir de projetos completos. Na segunda, o IAB-RJ insta os candidatos a se comprometerem com uma cidade inclusiva, a partir de gestões transparentes, que promovam o tema da habitação de forma socialmente responsável. Particularmente, na questão da urbanização de favelas, que foi uma política continuada do município do Rio de Janeiro, e que não está mais em curso, o presidente do IAB-RJ questionou o candidato para esclarecer seu posicionamento. Molon, mencionou o concurso de metodologias de urbanização de favelas promovido pelo IAB-RJ, como um marco que deve ser retomado, e transformado numa política de Estado.

O candidato Alessandro Molon acatou as propostas contidas em ambas as cartas, se comprometendo a implementar integralmente suas proposições. A íntegra das cartas pode ser vista abaixo:


CARTA DO IAB NACIONAL E DAS ENTIDADES DE ARQUITETURA E URBANISMO

 Compromisso pela qualidade das obras e
transparência nos gastos públicos

O Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR) e o Colégio Brasileiro de Arquitetos (CBA)  ̶  coletivo das entidades nacionais de arquitetura e urbanismo (composto por IAB, FNA, AsBEA, ABEA e ABAP)  ̶ , propõem o diálogo dos arquitetos e urbanistas com os candidatos a prefeito nas próximas eleições em defesa da cidade inclusiva e menos desigual, atenta ao meio-ambiente, sustentável e qualificada.

Reconhecem que, independentemente das questões específicas de cada cidade, há a necessidade das prefeituras assumirem, como função de Estado, o planejamento urbano de modo consistente e através de quadros permanentes.

Especialmente as obras públicas, em qualquer escala, precisam ser adequadamente planejadas de modo a cumprirem seus papéis para a sociedade com qualidade e correto uso dos dinheiros públicos.

Nesse sentido, propõem que o candidato a prefeito assuma o compromisso de, caso eleito, somente licitar obras depois de terem sido elaborados os correspondentes Projetos Completos (isto é: Estudos Preliminares, Anteprojetos, Projetos Executivos, de Arquitetura e Complementares, bem como Orçamentos e Especificações de toda a obra).

Em obra pública, quem constrói não projeta.
Quem projeta não constrói.

CARTA DO IAB-RJ RETIRADA NA REUNIÃO DO CONSELHO ESTADUAL DE 29 DE AGOSTO DE 2016

Direito a um Rio de Janeiro democrático e sustentável

O Departamento Rio de Janeiro do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB-RJ), em sintonia com o Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR) e com o Colégio Brasileiro de Arquitetos (CBA), coletivo de entidades das entidades nacionais de arquitetura e urbanismo (composto por IAB, FNA, AsBEA, ABEA e ABAP) propõe o diálogo dos arquitetos e urbanistas com os candidatos a prefeito das próximas eleições em defesa da cidade inclusiva e menos desigual, atenta ao meio ambiente, sustentável e qualificada, sublinhando os seguintes pontos:

•Licitação de obras depois de terem sido elaborados os correspondentes Projetos Completos (isto é: Estudos Preliminares, Anteprojetos, Projetos Executivos, de Arquitetura e Complementares, bem como Orçamento e Especificações de toda a obra);
•Liderança da cidade do Rio de Janeiro na discussão metropolitana;
•Planejamento integrado da cidade com fortalecimento dos órgãos técnicos;
•Planejamento articulado com os 21 municípios da Região Metropolitana do Rio;
•Integração das políticas e secretarias municipais;
•Desenvolvimento da gestão participativa da cidade;
•Transparência no planejamento da cidade, com a submissão das decisões à sociedade civil organizada;
 •Retomada da política de habitação interesse social, articulada com uma política continuada de urbanização de favelas.
•Fomento ao investimento em habitação no Centro e adjacências;
•Fomento à mobilidade urbana, com destaque aos modais de alta capacidade; 
•Proteção ao patrimônio cultural e aos mananciais, lagoas e rios;




sábado, 3 de setembro de 2016

Debate na Casa da Suíça sobre a cidade pós-olímpica do Rio de Janeiro

Foto de Maria Alice Nogueira
No último dia 31 de agosto, no espaço montado na beira da Lagoa Rodrigo de Freitas da Casa da Suíça foi debatido o futuro da cidade do Rio de Janeiro, com a mediação da jornalista Flavia Oliveira, e a participação dos palestrantes; Eduarda La Roque do Pacto do Rio, Jean Jacques Fontaine jornalista suíço, Augusto Ivan de Freitas Pinheiro da Empresa Olímpica Municipal, Christopher Gaffney geógrafo americano, e Pedro da Luz Moreira presidente do IAB-RJ. Antes dos debates foi apresentado o sensível trabalho do fotógrafo Michael von Graffenried, sobre a cidade do Rio de Janeiro, no período antes dos jogos olímpicos, que mostrou imagens ricas da sua diversidade de espaços e pessoas. A diversidade de visões presentes na mesa anunciava uma noite de polêmicas e controvérsias entre os debatedores, que na verdade não se realizou, pois todos assumiram uma disponibilidade de ouvir e debater, que poucas vezes presenciei.

O debate se caracterizou pelas visões pessimistas e otimistas sobre o futuro da cidade do Rio de Janeiro, houve quase um consenso quanto a ausência de uma direção clara, uma forma eleita de cidade que queremos ser. Os grandes eventos, como a Copa do Mundo e as Olimpíadas foram problematizados na sua real dimensão, embate ou contradição, como um conflito entre interesses locais e globais. Arranjos e ações, que precisavam dar conta de uma pauta complexa, vinculados àquilo que Debord caracterizou como a Sociedade do Espetáculo, ou uma visão da cidade competitiva, capaz de atrair investimentos internacionais. Um modelo que vem operando no mundo desde Baltimore nos EUA, no final da década de sessenta, e que está baseado numa ferrenha competição para atrair capital especulativo e volátil. Essa dimensão financeira ou rentista acaba contaminando todos os poros da sociedade contemporânea, que acaba sobrevalorizando a obtenção de ganhos abstratos, deslocados de movimentos produtivos reais.

Na minha fala procurei destacar que os planos e projetos eram instrumentos que possibilitam a participação de todos, uma vez que em suas fases iniciais os desenhos permitem o levantamento de hipóteses, que são escolhidas ou descartadas em função dos benefícios alcançados e os custos que esses implicam. A nossa visão de qual cidade queremos ser no futuro possui a meu ver uma premissa básica, que está também no campo da macro-política brasileira, que se refere a busca de uma sociedade mais equilibrada, sem a separação brutal de oportunidades que hoje vivemos. O território da cidade, talvez seja a dimensão mais concreta da clivagem de oportunidades das cidades brasileiras, basta compararmos; Ipanema e São Gonçalo para se entender como o projeto da cidade brasileira é excludente. De um lado, a opulência de recursos e pensamentos, que se mostra internacionalmente, e de outro, uma certa invisibilidade e informalidade, que simplesmente é recalcada do nosso território como inexistente, quando se trata dos eventos internacionais. Procurei destacar, que mesmo nessa última, no âmbito da sobrevivência possível, nessa precariedade de recursos, há uma potência de criatividade e de empreendedorismo, que precisa ser incluído. Afinal, nosso mercado formal de produção e reprodução da cidade brasileira, ainda hoje, não consegue atender uns 30% da demanda brasileira, que permanece na auto produção de sua própria habitação.


quinta-feira, 1 de setembro de 2016

Em debate, a privatização da CEDAE

Vazamento em tubulação de grande porte da CEDAE
Está em curso um debate sobre a privatização da companhia de distribuição de água e de coleta de esgotos do estado do Rio de Janeiro, a CEDAE, que está profundamente articulado com a crise de arrecadação do mesmo estado. Mas que deveria principalmente apontar para a qualidade dos serviços de distribuição de água tratada e coleta de esgotos para a população do estado do Rio de Janeiro, uma vez que esses serviços possuem imenso impacto sobre sua saúde. Importante salientar, que se trata da maior tarifa cobrada no Brasil para esse serviço, em São Paulo R$2,26/M3 e no Rio de Janeiro R$3,64/M3 e na média nacional R$2,40/M3. Apesar dessas tarifas, os índices da CEDAE são pífios, no que concerne ao atendimento de qualidade da população nessa área.Apenas como exemplo, na cidade de Duque de Caxias das 170 escolas do ensino básico, nada menos que 70 dessas são abastecidas de forma recorrente por carro pipa, segundo informações do secretário de planejamento do município Luiz Edmundo, em recente encontro público.Segundo dados da ONG Trata Brasil, o estado do Rio de Janeiro apresenta os seguintes índices; rede de água tratada 89,3%, coleta de esgotos 44,96%, tratamento adequado dos esgotos 34,66% e perdas na rede de água tratada 31,14%.

Fica clara a fragilidade do estado do Rio de Janeiro, no que concerne a esse assunto, e a necessidade premente de mudanças no cenário da gestão do saneamento. Importante também salientar que há uma série de externalidades presentes em torno da questão do saneamento básico, dentre eles pode-se destacar o recente impacto, que a epidemia de Zika teve sobre as expectativas de turismo na cidade olímpica. Apesar da reprodução do mosquito transmissor apenas ocorrer em águas limpas, deve-se considerar que o descontrole na distribuição da água pode implicar em uma série de oportunidades de ocorrência dessa reprodução.

Outra condicionante do problema é a extrema dispersão da cidade metropolitana do Rio de Janeiro, que segundo dados da Câmara do Grande Rio recentemente instalada, cresce 60Km2/ano. Tal dado é absolutamente assustador, principalmente quando leva-se em conta que o município de Nilópolis na Baixada Fluminense possui uma área de 34Km2. Estamos portanto, crescendo em área a índices correspondente a duas Nilópolis por ano. Essa imensa dispersão da mancha urbana da cidade metropolitana do Rio de Janeiro dificulta e encarece de sobremaneira a pretensão de universalização dos serviços de infraestrutura, como distribuição de água e destinação correta de esgotos. Sem que se mude essas tendências inerciais da cidade brasileira sempre ficará muito caro para os contribuintes universalizar o saneamento básico, seja com uma empresa pública ou privada.

E, aqui me parece importante assinalar que a eventual privatização ou manutenção pública da CEDAE deve considerar a obtenção de índices mais adequados de saneamento, um melhor atendimento ao usuário, o cidadão. Não tem sentido usar de argumentos relativos a crise fiscal do estado do Rio de Janeiro para privatizar a CEDAE, sem pensar, ou esquecendo-se da necessidade de melhora dos índices de saneamento.