domingo, 5 de janeiro de 2014

Caetano Veloso fala sobre Salvador e o urbanismo brasileiro

O centro de Salvador
No jornal O Globo de hoje, dia 05 de janeiro de 2014, o compositor e cantor baiano, Caetano Veloso escreveu sobre a cidade de Salvador com veneração e ódio. Ele começa determinando que esta cidade é um espelho do nosso país, pois "fala de modo enfático sobre as coisas do Brasil." Sem dúvida, as cidades são espelhos que refletem nosso estágio de desenvolvimento social.
Afinal, em que lugar poderíamos encontrar marcado de forma concreta em seu território as maneiras da nossa história.

Caetano também menciona a luz do lugar que Salvador ocupa, como uma característica mágica daquele pedaço do nosso planeta; "luz dourada que banha o lugar onde ela (Salvador) se ergueu..." Como poeta que é, Caetano sabe que as obras humanas são efêmeras e que o fenômeno da posição cósmica da cidade de Salvador, seu mar, sua luz, permanecerão muito além do mero episódio, que é a construção humana.

Mas Caetano também celebra de forma saudosista a Salvador de seus "17 para 18 anos" e menciona Stefan Zweig que nos anos 30 do século XX, "escreveu, entre muitas outras coisas para as quais deveríamos prestar mais atenção, que 'o Brasil tem as cidades mais bonitas do mundo'..."Contrapõe a esta visão idílica das cidades brasileiras os depoimentos de Lévi-Stauss que foram mais duros e críticos com relação às nossas aglomerações, concluindo "que o tempo só fazia e só faria mal ao urbanismo brasileiro."

A partir daí, o compositor se lamenta, considerando que Salvador e outras cidades brasileiras perderam a oportunidade de "planejar sua modernização mantendo-a... teríamos hoje uma jóia do Atlântico Sul, em lugar do caos que vemos." Certamente Caetano se refere ao antigo centro de Salvador e as suas adjacências imediatas, que nos seus 17 para 18 anos se constituíam na imagem mais forte da cidade.

Recentemente, comentei aqui no blog o desperdício que percebi na cidade de Salvador, num texto de 12 de maio de 2013, no qual identificava a opção feita pela capital baiana por uma forma de vida urbana centrada no carro individual, nos condomínios isolados, e no abandono do seu antigo centro, como local de moradia. Também apontava, que este abandono do centro representava uma perda na qualidade de vida dos seus habitantes, que retro-alimentava uma sensação de insegurança, pois...

"Este equipamento - o centro de Salvador - possui um patrimônio construído invejável, com um conjunto de edificações que materializam um contexto único e maravilhoso, que nos orgulha como brasileiros. Uma pena, que esta estrutura notável encontre-se tão abandonada, edificações desocupadas, ruas desertas, dominadas pela insegurança."

O problema não está apenas em Salvador, mas na maioria das cidades brasileiras, que optaram pelo rodoviarismo desenfreado, pelo comércio de shopping centers, e pela habitação em condomínios fechados, que se separam do conjunto da cidade. O urbanismo brasileiro precisa agora no momento atual restaurar não só as edificações dos seus centros históricos, mas torná-los habitáveis e sintonizados com a vida contemporânea. Assim confirmaremos a avaliação de Stephan Zweig e reconstruiremos nossas cidades replanejadas e belas, para que Caetano Veloso possa realizar o que afirma ao final de seu texto; "mas meu sonho não acabou."