sábado, 13 de junho de 2015

Fernando Brant, Clube da Esquina e Belo Horizonte

Lô Borges, Fernando Brant, Juscelino Kubitscheck, Milton
Nascimento e Marcio Borges em Diamantina em 1971, com
JK já cassado pela ditadura
Fernando Brant era um letrista fantástico, ele morreu hoje dia 12 de junho de 2015 num hospital de Belo Horizonte, capital de Minas Gerais. Suas músicas e letras falam muito dessa cidade de Belo Horizonte, que me parecem ainda estão lá presentes...

A capital de Minas Gerais, Belo Horizonte, nasceu da destruição do antigo Curral D´El Rei, arraial de traçado colonial. A nova capital nasceu com um desenho higienista, francófilo e modernizante, que contrapunha uma malha de ruas vicinais a uma grelha de largas avenidas mais espaçadas. A república brasileira elegeu uma certa ideologia de assento francófilo e cartesiano para o desenho da nova cidade, desprezando nosso passado de colônia portuguesa. Ruas adequadas a topografia, correndo a meia encosta de traçado orgânico foram substituídas pela racionalidade da reta, que enquadrava perspectivas e enfrentava as declividades violentas do sítio da nova cidade. Apesar disso, esse desenho reforçava a presença das esquinas, principalmente na interesecção entre as malhas de avenidas e de ruas vicinais, gerando uma confluência de quatro logradouros, que conformaram lotes de ângulos agudos e obtusos preciosos para o desenvolvimento posterior da arquitetura.

O famoso Clube da Esquina dos anos 1960 não se instalou numa dessas esquinas do plano de Aarão Reis, mas no bairro de Santa Teresa, que ficava além do traçado da Avenida do Contorno, numa área considerada fora da área urbana da cidade, na sua implantação em 1897. Mas apesar desse fato, o nome Clube da Esquina capta esse espírito presente na cidade, das possibilidades da encruzilhada, das potencialidades de uma diversidade de direções. O nome Clube da Esquina me parece possui uma incrível força e apelo não só para BH, mas para todo o Brasil e também para o mundo. Ele se refere a um ponto fundamental de todas as cidades no mundo, um ponto crucial para construção de uma especificidade única, apesar de se repetir em várias partes do mundo. Na verdade, a história oficial do nome é bem outra;


"O nome do grupo foi ideia de Márcio que ao ouvir a mãe perguntar dos filhos, ouvia a mesma resposta: "Estão lá na esquina, cantando e tocando violão." De acordo com Lô Borges nos "bastidores" do seu DVD "INTIMIDADE" de 2008, o nome "Clube da Esquina" se deu por acaso, quando um amigo abonado, passando de carro pela esquina onde ele e os amigos se reuniam, resolveu convidá-los para seguir com ele para um clube onde a rapaziada mais abastada costumava se divertir. Como a condição econômica deles não permitia frequentar clubes, um deles respondeu: "Nosso clube é aqui,na esquina!" 

Portanto, o acaso parece que trouxe para o grupo de músicos mineiros um nome poderoso, capaz de sintetizar a diversidades de possibilidades para quem se encontra numa esquina, A descrição de Lô Borges traz também o testemunho de uma certa divisão amistosa presente em várias cidades entre abastados e desabastados, mas que apesar disso. todos encontram diversão e possibilidades no mesmo território. Essa era também uma das características da cidade no entorno dos anos 70 e 80, quando enfrentar a madrugada procurando um boteco aberto era tão seguro como cruzar sua própria sala de estar.

Muito além disso tudo, a capital mineira, BH, sempre se caracterizou por atrair gentes das mais diversas localidades de Minas e de muito além do estado, que se encontravam no seu solo e desfrutavam das suas amenidades. Fernando Brant era de Caldas, cidade no sul de Minas, e assim como outros membros do clube se instalara com a familia há poucos anos. Esse clima receptivo de Belo Horizonte para a diversidade de origens e para uma certa curiosidade de comportamentos diferentes era também uma das mais notáveis características da cidade, nos tempos que por lá vivi, exatamente os anos 70 e 80...

O que me parece importante destacar nesse contexto é que as mais diversas sinergias humanas, musicais, ou empreendedoras, ou culturais são dependentes de uma certa qualidade de vida no ambiente urbano, que promove e possibilita o encontro de criatividades.