quarta-feira, 13 de abril de 2016

Debate sobre a crise atual brasileira no IAB-RJ esclarece vários pontos

Marcos Nobre, Lena Lavinas, Argelina Figueiredo e André Singer
Na última segunda feira dia 11 de abril de 2016 reuniu-se no auditório do IAB-RJ uma mesa auto-denominada Encruzilhadas da Conjuntura, com a presença do cientista político da USP André Singer, o professor de filosofia política da Unicamp Marcos Nobre, e a professora de economia política da UFRJ Lena Lavinas, que foram mediadas pela moderação da professora da Uerj Argelina Figueiredo. O debate foi de altíssimo nível, e reuniu visões diferenciadas sobre a atual crise brasileira, demonstrando que é possível reunir o contraditório para ampliarmos o esclarecimento sobre nossa atual conjuntura econômica e política e termos capacidade de imaginar um outro arranjo societário.

A primeira fala do cientista político ligado ao PT, André Singer procurou identificar no movimento do Impeachment da Presidente Dilma uma inflexão, ou ruptura de aliança, entre dois projetos distintos de país. De um lado, o recrudescimento do neo-liberalismo, expresso no documento a Ponte do PMDB, e de outro o social-desenvolvimentismo do PT, que se aliou de forma precária com o mesmo neo-liberalismo, desde o primeiro governo Lula. Singer reconhece e identifica a presença de uma certa hegemonia neo-liberal e financeira na política, que não arrefeceu desde os anos 1980 com a ascensão de Thatcher e Reagan, oferecendo como exemplo a recente ascensão do partido radical de esquerda na Grécia, que acabou adotando encaminhamentos rentistas, alinhados com os neo-liberais, que privilegiaram o pagamento das dívidas.

Um elemento, ainda posicionado fora dessa dualidade política é a Operação Lava-Jato, instalada no Poder Judiciário brasileiro, que pode representar algo novo, "se possibilitar a identificação da corrupção de forma equilibrada entre várias forças políticas, sem pretender se alinhar ou eleger qualquer uma delas como principal operadora." Efetivamente, a partir da prisão coercitiva do presidente Lula e do vazamento seletivo de algumas conversas telefônicas, por parte da Operação Lava-Jato instala-se uma forte suspeição, com relação ao não alinhamento com as tendências neo-liberais em luta.

A segunda palestra foi do professor de filosofia política da Unicamp Marcos Nobre, que se utilizou de uma metáfora ferroviária das locomotivas, apontando o PMDBismo ou o centro como principal indutor político brasileiro. O filósofo também se posicionou num lugar "mais favorável para se pensar, no pós-impeachment, seja qual for o resultado" e apontou, que a conjuntura brasileira e a crise atual são fruto da ausência de uma reflexão mais aprofundada, com relação às manifestações de junho de 2013. Para Marcos, o projeto Petista para enfraquecer o PMDB envolveu o incentivo à pulverização das forças partidárias na Câmara Federal, desideologizando uma série de posicionamentos em nome de que essa fragmentação viabilizava a governança.

Para Marcos Nobre o processo de ampliação das conquistas democráticas no Brasil se encerra com as manifestações de rua de junho de 2013, que demonstraram uma forte revigoração da pauta de reinvindicações fora do sistema partidário do país, e ainda sem resposta das lideranças políticas brasileiras. Naquele momento a pauta pela melhoria das condições de vida nas cidades brasileiras, com a generalização de melhoria das condições de habitação, mobilidade, saúde e educação em comparação aos investimentos dispendidos nos estádios da Copa do Mundo, se constituiram na principal força mobilizadora. Também para Marcos Nobre, a Operação Lava-Jato apresenta uma forte indefinição das suas intenções, o que sabemos dela é que se inspira na operação Mãos-Limpas da Itália, que desestabilizou completamente o sistema político daquele país, sem que esse atingisse maior eficiência no combate à corrupção. Por fim, Marcos Nobre apontou a necessidade de rearticulação do campo da esquerda no Congresso e nas Ruas, sem que o PT pretenda ou se coloque como força hegemônica. Para o filósofo existe por parte da esquerda brasileira uma profunda incompreensão, ou incapacidade de se identificar com novos movimentos que representam mudanças efetivas. A distinção importante entre manutenção do status quo, das formas tradicionais de fazer política e as efetivas demandas sociais, do interesse público e geral precisam ser repensadas.

A terceira fala foi da economista Lena Lavinas, que identificou de forma muito veemente no campo da esquerda um erro tático e estratégico com relação ao sistema de funcionamento do capital no mundo contemporâneo. A professora apontou que a forma de regulação do capital não é mais fordista e produtiva, e identificou na financeirização e no endividamento progressivo das pessoas a forma prioritária de atuação do sistema contemporâneo. Portanto, um projeto social-desenvolvimentista não poderia apenas investir e celebrar no consumo do mercado interno apenas de produtos ligeiros, que na verdade impulsionaram um imenso crescimento do endividamento familiar. A professora mostrou dados, que demonstram como o investimento em infra-estrutura desde o fim da ditadura declinou no Brasil, notadamente naqueles ítens que poderiam representar ganhos indiretos de qualidade de vida, como; saneamento, saúde, educação e mobilidade.

Por outro lado, a professora Lavinas também reconheceu na Constituição de 1988, um marco regulatório importante, capaz de impulsionar parâmetros concretos na busca de uma sociedade com mais equidade. Nela estão fixados o direito à seguridade social, à saúde, à moradia para todos, que certamente significam ganhos de renda, muito além dos aumentos salariais, que efetivamente ocorreram a partir do governo Lula. A fala da professora apontou claramente que o projeto da esquerda para o Brasil comandado pelo PT e também no resto do mundo deixou-se capturar pela financeirização;

"Quando voce analisa indicadores relativos à saneamento ou saúde, as alterações são muito pequenas. Quando considera televisões e telefones celulares são altíssimos. Vivemos uma financeirização da esquerda, como definiu Roberto Grün, abrimos mão da criação de uma sociedade coesa e unida, na qual pegamos o mesmo metrô e vamos a escola juntos." LAVINAS, Lena

Portanto, o debate no IAB-RJ teve um excelente nível e nos faz refletir, que nossas decisões no presente imediato acabam por determinar e condicionar alinhamentos e rumos futuros para nossa sociedade.
“Quando você analisa indicadores relacionados à saneamento ou saúde, as alterações são muito pequenas. Quando considera televisões ou telefones celulares, são altíssimos. Vivemos uma financeirização da esquerda, como definiu Roberto Grün: abrimos mão da criação de uma sociedade coesa e unida, na qual pegamos o mesmo metrô ou vamos à escola juntos” - See more at: http://www.cee.fiocruz.br/?q=node/136#sthash.X2sZSyke.dpuf
“Quando você analisa indicadores relacionados à saneamento ou saúde, as alterações são muito pequenas. Quando considera televisões ou telefones celulares, são altíssimos. Vivemos uma financeirização da esquerda, como definiu Roberto Grün: abrimos mão da criação de uma sociedade coesa e unida, na qual pegamos o mesmo metrô ou vamos à escola juntos” - See more at: http://www.cee.fiocruz.br/?q=node/136#sthash.X2sZSyke.dpuf
“Quando você analisa indicadores relacionados à saneamento ou saúde, as alterações são muito pequenas. Quando considera televisões ou telefones celulares, são altíssimos. Vivemos uma financeirização da esquerda, como definiu Roberto Grün: abrimos mão da criação de uma sociedade coesa e unida, na qual pegamos o mesmo metrô ou vamos à escola juntos” - See more at: http://www.cee.fiocruz.br/?q=node/136#sthash.X2sZSyke.dpuf