quinta-feira, 21 de abril de 2016

A ciclovia Leblon - São Conrado, tragédia anunciada

Foto da Gruta da Imprensa com o viaduto Rei Alberto, antes
da ciclovia Leblon - São Conrado
O acidente com a ciclovia Leblon - São Conrado, ocorrido no dia 21 de abril de 2016 na cidade do Rio de Janeiro  é uma tragédia anunciada, que nos revela muito da forma como o projeto das obras públicas vem sendo desenvolvidos em todo o Brasil. De forma generalizada há a presença de um sentido de urgência, que pensa de forma equivocada, que o tempo dedicado ao projeto é perda de tempo. Como se o ato de pensar antes de fazer, que ao final é o sentido do plano e do projeto, fosse uma perda de tempo, uma vez que a obra com sua dimensão prática resolveria no calor do canteiro todos os problemas. A tragédia do acidente da ciclovia, que significou a morte de duas pessoas por conta do colapso da estrutura da laje nos mostra, que mesmo aspectos da segurança estrutural podem ter sido negligenciados em função dessa urgência.

O viaduto Rei Alberto
A cidade do Rio de Janeiro foi recentemente elevada pela UNESCO à condição de patrimônio natural e construído da humanidade, exatamente por sua configuração única e inusitada, reunindo natureza e obra humana. O descuido no apuro do desenvolvimento dos projetos fica patente pelo desrespeito da nova obra pelas pré-existências do Patrimônio Histórico e Artístico, como a Gruta da Imprensa ou Viaduto Rei Alberto (mostrados nas fotos). Esses aspectos históricos e de interação de novas intervenções com antigas obras de valor, que podem parecer de menor importância frente a segurança da obra, denunciam muito da forma açodada como as obras públicas vem sendo realizadas. A nova intervenção não teve o devido cuidado na sua aproximação com a obra antiga, denunciando de forma clara a pressa e a urgência das obras.

Estamos diante de graves acontecimentos que precisam ser apurados e monitorados com rigor, mas que as recentes notícias mudando a forma de contratação das obras públicas por parte do governo federal, como a contratação integrada e o Regime Diferenciado de Contratação (RDC) demonstram exatamente a supremacia vitoriosa da pressa e da urgência, ou por um certo desdém pela etapa de desenvolvimento dos projetos. Há muito, que a rede nacional do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) defende que os realizadores dos projetos, sejam eles; de estrutura, de urbano, de arquitetura ou de qualquer natureza não sejam os mesmos dos responsáveis pela implantação das obras e que sejam contratados pelo poder público. Tal prática nos parece garantiria uma maior autonomia para o desenvolvimento do projeto minimizando riscos, e determinando um controle compartilhado dos canteiros de obras. A contratação integrada, que delega ao empreiteiro a responsabilidade pelo desenvolvimento dos projetos e pela implantação das obras, não possibilita a devida autonomia à etapa fundamental, de pensar o que será feito.

Todos aguardamos ansiosos pela apuração dos fatos.

Debate no IAB-RJ sobre o Mat-building proposto pelo Team X na década de 60

O arquiteto Graziano Brau Pani
O jovem arquiteto italiano Graziano Brau Pani debateu no auditório do IAB-RJ na última quinta feira dia 14 de abril de 2016, sobre proposições colocadas no final dos anos cinquenta por um grupo de arquitetos denominado Team 10, que se contrapôs aos posicionamentos funcionalistas colocados pela Carta de Atenas de 1933, no IV Congresso Internacional de Arquitetura Moderna (CIAM), que determinaram a prática arquitetônica até o final dos anos 50 do século XX. As proposições do Team 10 no final dos anos 50 revolucionaram a forma como compreendemos o objeto arquitetônico, sua inserção urbana, a posição dos usuários e os gradientes entre a esfera pública, semi-pública, semi-privada e privada, principalmente no tema habitação. As principais premissas do Team 10 para o projeto, que questionaram fortemente o funcionalismo sistêmico do modernismo, foram a democratização do programa e a responsabilidade social da construção do espaço humano.

Cartaz da palestra
O principal conceito debatido foi o de mat-building, que foi uma premissa desenvolvida por  Peter Smithson (1923-2003) e Alisson Smithson (1928-1993), arquitetos ingleses, que publicaram o artigo;‘How to recognise and read mat-building”, que aborda o tema do sistema,  da repetição e da especificidade na formulação do espaço construído. Portanto, um posicionamento que se colocava fortemente contra uma ortodoxia estabelecida, que permanecia com uma visão estática da construção humana, centrada no objeto espacial isolado, como um elemento de contemplação da arquitetura, e não como processo de produção e reprodução do ambiente construído pelo homem. Nas palavras do arquiteto italiano Graziano Brau, os parâmetros norteadores do mat-building eram; pessoas, participação e tempo. A proposta inseria no processo de desenvolvimento dos projetos, a ideia de sistema, como um processo aberto e acolhedor, para as demandas mutantes dos mundos da vida, não só no período de sua concepção, mas também no da sua operação.

Uma espacialidade aberta a múltiplos usos e não mais determinada por um funcionalismo restritivo desembocava numa racionalidade processual, capaz de entender o projeto e o desenho como o território do conflito. Os exemplos trazidos pelo arquiteto italiano mostraram diferentes apropriações da metodologia mat-building, como a Casa Patio em Tolouse de 1961, a Kasbah de Piet Bloom de 1973, a Nexus World em Tóquio de 1991 do escritório OMA, e a Carambachel 11 em Madrid de 2006 do escritório Morphosis. A análise desses diferentes exemplos se pautou pela compreensão dos espaços de circulação, de estar, da capacidade de abrigar múltiplas funções e da sua inserção urbana. A modulação e a flexibilidade de alguns espaços foram destacados a partir de um rigoroso trabalho de compilação dos desenhos desses projetos, que media sua adequação a partir da presença da repetição e da surpresa, a legibilidade geral e o particularismo específico.

Nas minhas considerações sobre a palestra do arquiteto italiano Graziano Brau Pani, citei os trabalhos dos arquitetos Manfredo Tafuri e Carlos Nelson dos Santos, o primeiro no livro A esfera e o labirinto e o segundo em A cidade como um jogo de cartas, que citam sistemas modulares, homogeneizadores e repetitivos que geraram diversidades. A questão da forma do projeto, tanto no processo de concepção, como também na sua apropriação depois da construção permanecem como temas centrais para o nosso ofício.

Abaixo link para o site do IAB-RJ.

http://www.iabrj.org.br/graziano-brau-discute-sistema-mat-housing-no-iab-rj