quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019

UM CONTRA PROJETO PARA A CIDADE BRASILEIRA, O CASO DO RIO DE JANEIRO


Capa do livro aonde foi publicado o 
artigo

O texto no livro ao lado foi publicado em inglês, abaixo sua tradução para o português. Boa Leitura...


Pedro DA LUZ MOREIRA

Universidade Federal Fluminense, Escola de Arquitetura e Urbanismo, Departamento de Arquitetura, Rio de Janeiro, Brasil, email: daluzmoreira.pedro@gmail.com

RESUMO:

Nesse V Seminário de Arquiteturas Imaginadas: Representação Gráfica Arquitetônica e outras imagens em São Paulo cabe uma reflexão sobre as práticas e atuações políticas com as quais o Brasil vem se confrontando ao longo dos últimos anos para conformação de seu território e de suas cidades. Nossa política urbana. Responsabilidade do Ministério das Cidades, criado em 2002 em Brasília, e que pretendia não apenas repetir a forma inercial de reprodução da cidade brasileira, mas gerar uma outra aglomeração, mais justa e mais inclusiva. A pergunta permanece, uma revisão do que conseguimos ou lutamos por realizar, um contra projeto de cidade para o Brasil pode ser imaginado, desenhado e sonhado?

1.1. Macro política
Dentro do contexto mais geral, no Brasil e no mundo percebe-se o declínio da narrativa do neo-liberalismo, como discurso de legitimação da macro política, a partir da crise do sistema financeiro internacional de 2008. No entanto, ainda não emergiram propostas alternativas, que ocupem o espaço deixado pela doutrina da austeridade fiscal, que parece ainda governar as ações dos mais diversos espectros políticos, não só no Brasil, mas em todo o mundo. Fato, que denuncia a clara ausência de identidade de governos de esquerda, nos últimos anos, não apenas no Brasil, mas em várias partes do mundo. Essa afirmação pode ser comprovada, com um retorno aos períodos de Felipe Gonzalez (1982-1996) na Espanha, Tony Blair (1997-2007) na Inglaterra, ou Françoise Hollande (2012-2017) na França, ou mesmo Lula (2002-2010) e Dilma (2011-2016). Todos acabaram fazendo caixa de ressonância da questão da austeridade nas contas públicas, moderando discursos de maior distribuição de renda e enveredando por processos, que claramente incentivaram o patronato em detrimento do mundo do trabalho. No campo específico da ordenação do território, esses governos invariavelmente tiveram uma atitude pró mercado imobiliário, abrindo mão da regulação do valor da terra pelo Estado, abrindo mão de uma gestão pública (ver ROLNIK 2015)

Todas essas formas de governo enveredaram por uma busca do consenso por cima, isto é sem a participação das massas despossuídas, investindo fortemente no modelo da social democracia europeia do segundo pós guerra. Isto é, não houve um investimento na radicalização da democracia, na participação intensa das massas populares. E, num campo caro aos arquitetos e urbanistas, a definição da política habitacional e de conformação do território da cidade, espaço onde as ofertas de oportunidades aos estratos sociais mais fragilizados aparecem de forma muito clara e até didática.

"Quem busca consenso é regime autoritário, Democracia não. Democracia é o reconhecimento do conflito, a busca da negociação e a procura de acordo, sempre provisório, em função da correlação de forças." Fernando Henrique Cardoso, citado em COUTINHO 1979 página47

O plano e o projeto, enquanto pré-figurações territoriais são instrumentos poderosos para explicitação desses conflitos inerentes a democracia, e a sua radicalização, podendo significar um importante impulso na explicitação da diversidade de oportunidades existentes na nossa sociedade. E, aqui fica claro a grande frustação, que representou a chegada ao poder do Partido dos Trabalhadores (PT), que tinha como principal discurso ideológico o combate a forma de operar da via prussiana[1], afinal o partido repetia que pretendia o autogoverno dos trabalhadores e das massas excluídas pela história. A figura de Lula envolvia um grande simbolismo, afinal era a própria encarnação dessa adesão ao precariado brasileiro, o líder sindical que no seu aparecimento se declarava contra a contribuição sindical obrigatória, era filho de imigrantes nordestinos, e sobrevivera em São Paulo como empregado metalúrgico da modernização conservadora da ditadura civil-militar. Mas o simbolismo da conquista logo se demonstrou como continuidade da forma tradicional de operar das elites brasileiras - a via prussiana -, que apesar da promoção de uma inclusão inusitada, se recusou a superar a velha operação excludente, carente de socialização tanto política quanto econômica. Afinal,a tese de que "a mudança será promovida pelo poder do Estado, e não pela auto-organização da vida social", mais uma vez venceu, e também se demonstrou falha. Mais uma vez, os governos do PT acabaram reféns das pautas financeiras dos grandes bancos nacionais e das demandas das grandes empreiteiras.
A questão fica descaradamente mais clara, quando nos debruçamos sobre a forma de operar do Estado brasileiro na configuração de nossa infraestrutura urbana e de desenvolvimento, que na verdade manteve-se privatizada e operada em benefício de uma minoria, as grandes empreiteiras. As obras da Copa do Mundo de 2014, ou os investimentos em mobilidade urbana, ou as novas instalações da industria petrolífera, ou ainda as obras das Olimpíadas de 2016 no Rio de Janeiro, enfim os planejamentos estruturantes de nossas cidades e de nosso território seguem sendo determinados por interesses particulares, que sequer fazem consultas às grandes maiorias. Na concepção das elites dirigentes do país o constante desleixo pelas ações de plano e de projeto, e a predominância dos interesses apenas dos agentes executores denunciam de forma recorrente a privatização da burocracia estatal brasileira. Essa forma de operar predatória, e que opera na lógica da apropriação do maior número de benefícios imediatos, como se a nação não tivesse futuro ou novas gerações acabou gerando e fomentando grandes escândalos de corrupção, repetindo a via prussiana. O presente trabalho parte do pressuposto, de que as ações de planejamento e projeto socialmente transparentes são fundamentais para a radicalização da democracia, desde que suas pré figurações sejam apresentadas a um universo mais amplo, conformando uma participação cidadã.

O declínio da forma de atuar da social democracia no Brasil e no mundo, abraçando a regulação social do patronato, do mercado imobiliário, penalizando o mundo do trabalho e se envolvendo em processos de gentrificação urbana foi um processo gradual de longo prazo. Ele se iniciou com a crise do petróleo de 1973, e os seus rebatimentos no conflito Israel-mundo árabe, com consequências também para o equilíbrio do sistema colonial determinaram a primeira crise global do pós-guerra, desarrumando o crescimento e a distribuição de renda desse período. Alguns autores mencionam uma inversão peculiar que o sistema capitalista foi capaz de operar, com relação a pauta do Maio de 68, na qual existia uma clara crítica ao Estado burguês, burocrático e disciplinar. Maio de 1968 recusava o estado e as instituições de controle burocrático tanto da democracia liberal, quanto do socialismo soviético. Se revoltava contra a reprodução material, os dispositivos de controle social, a partir de uma crítica totalizante ao capitalismo como sistema econômico e modo de existência, recolocando a questão da democracia e da revolução. No entanto, ao final da década de setenta e começo dos anos oitenta, a direita capitaneada pelo mundo anglo-saxão, com a primeira ministra Margaret Thatcher da Inglaterra, e o presidente americano Ronald Reagan tomam a dianteira e assumem propostas de desregulação e retração do Estado, atendendo de forma parcial a pauta de maio de 68.



"Os arautos do modelo econômico atual gostam de se ver como vencedores de um embate no qual teriam demonstrado ao mundo que o capitalismo neoliberal era a melhor forma, até mesmo a única, de produzir riqueza, inovação e bem-estar." SAFATLE 2017 página23

De fato é preciso reconhecer, que o discurso neoliberal conquistou muitos corações e mentes pelo mundo, colonizando não só formas de estruturar governos e instituições, mas também o cotidiano de variados agentes e atores. Efetivamente, o aumento da autonomia individual, ideias de flexibilidade do agir cotidiano, crítica ao Estado burocrático, celebração do empreendedorismo estavam presentes nas pautas do Maio de 68.



"Atualmente, conhecemos estudos que defendem a tese de que a ascensão do neoliberalismo no final dos anos 1970 é um peculiar desdobramento dos impulsos de Maio de 1968." SAFATLE 2017 página27 
"Deve-se assumir que a extrema direita foi capaz de constituir uma resposta política, ouvindo o descontentamento social, a insegurança produzida por um sistema econômico de pauperização e aumento de vulnerabilidade." SAFATLE página32

De uma hora para outra, o sistema instituído passou a celebrar a gramática do empreendedorismo, o declínio dos padrões de solidariedade social, a imposição de um individualismo competitivo que beira a animalidade, o fim do emprego, e a busca incessante pela desregulamentação. No entanto, com a crise do sistema capitalista avassaladora de 2008 esse discurso perde poder de convencimento, surgindo os primeiros levantamentos, inclusive de economistas liberais, de que a pobreza vem se ampliando de forma contínua, a partir da desregulamentação dos anos oitenta. No período de 1910-20, a renda dos 10% mais ricos representava entre 45% e 50% da renda nacional norte-americana. Essa porcentagem cai para 35% em 1950, chegando a 33% em 1970, revertendo essa tendência nos anos noventa, e retorna aos níveis de 1910-20 (45% a 50%) entre 2000 e 2010. O autor também destaca discursos que botaram em cheque, o argumento moral da meritocracia, como o trabalho de dois economistas italianos; Guglielmo Barone e Sauro Mocetti, que mostraram como os sobrenomes das pessoas ricas em Florença eram os mesmos há quase 500 anos, desde 1427 até 2011. SAFATLE também sublinha o cinismo do patronato nesses anos, na fala do multimilionário Warren Buffet;

"Quem disse que não há luta de classes? É claro que há uma, e estamos vencendo." Warren Buffet, citado por SAFATLE 2017 página24

Ainda no campo da macro política parece fundamental para o Brasil estruturar políticas que impulsionem um maior equilíbrio na distribuição de renda do país, revertendo uma das piores concentrações do mundo. A estruturação do território é um dos mais potentes instrumentos para distribuir oportunidades entre os cidadãos de um país, a questão da localização é fundamental para garantir acesso à educação, à saúde, à cultura e ao lazer. Atividades, que no espaço de uma geração garantem que famílias localizadas na zona da precariedade possam superar suas limitações. Portanto, a política urbana é um fator fundamental.
Num balanço geral, no campo da política urbana chegamos a conclusão de uma imensa mediocridade, nos nossos debates e em nossas experiências concretas, que não superaram velhos paradigmas instalados, que se repetem, sem ao menos ser oferecida uma alternativa. As cidades brasileiras, espaço onde habitam 85% da população nacional, aproximadamente 170 milhões de pessoas permanecem presas numa produção habitacional, que reproduz práticas do antigo BNH, como o Programa Minha Casa, Minha Vida (MC,MV). Ou na área de mobilidade urbana, onde reproduzimos de forma pouco criativa programas dos sistemas de Bus Rapid Transit (BRTs) de forma descoordenada, sem obter uma ação estruturada entre diversas transformações, que o urbano sempre exige.
No ano eleitoral de 2018 a questão urbana, que hoje aflige milhões de brasileiros, aproximadamente 170 milhões, não está pautada e não há previsão de ser discutida na campanha presidencial de forma clara e articulada. Os principais candidatos não polemizam o espaço construído brasileiro, e as alternativas a sua atual forma de se reproduzir e expandir. A cidade brasileira segue sendo produzida gerando; guetos de pobres e guetos de ricos que se protegem, evitando qualquer contaminação mútua, uma cidade com sua mobilidade dependente do automóvel particular, uma cidade dispersa e espraiada, onde as infraestruturas não estão universalizadas, e por último uma cidade que não convive bem com o meio ambiente natural.
Apenas nesses quatro pontos não identificamos e não formulamos qualquer proposta para se contrapor a inércia da atual produção da cidade brasileira, isto é seguimos com o Ministério das Cidades refém de uma política que repete práticas dos tempos tecnocráticos da Ditadura Militar. O déficit habitacional, que segundos estudos recentes chega a 6 milhões de moradias segue inalcansável, com os governos produzindo empreendimentos distantes e destituídos de qualquer urbanidade, nas periferias afastadas. Por outro lado, os antigos centros urbanos brasileiros, que invariavelmente concentram construções e esforços notáveis seguem esvaziados e abandonados, com seu patrimônio sendo deteriorado. As obras de mobilidade são tímidas e não penalizam os automóveis individuais que seguem recebendo subsídios dos governos, seja em isenção fiscal ou em obras viárias.

Enfim, precisamos urgentemente sacudir a poeira e mudar nossa política urbana, encarando de frente nossa inercial forma de fazer cidades.

1.2 Imaginação, Desenho, Plano e Projeto:


A imaginação, o desenho e o projeto se constituem como uma forma de abordagem do real, que não se restringe a uma mera contextualização e quantificação de problemas, eles investem fortemente no vir-a-ser, na constituição de cenários que não se restringem a reprodução do status quo atual. Na sua capacidade de construir cenários e visões do futuro, a imaginação, o desenho, o plano e o projeto se afastam do diagnóstico e se aproximam do prognóstico. Explicita-se o futuro, mas do que a análise do contexto existente. Aqui, emerge um risco da manipulação de imagens vazias, que não se confrontam com os problemas reais, colocados pelo conjunto da sociedade, que são suas efetivas pretensões de transformação. Daí a necessidade de construção de um programa de necessidades e expectativas, capaz de explicitar princípios gerais, que informam a imaginação, o desenho, o plano e o projeto a partir do que somos (diagnóstico), para propormos o que queremos vir-a-ser (prognóstico). A arquitetura e a cidade se constituem como comuns, patrimônios coletivos desfrutados por todos, por conformarem e representarem o coletivo. Quando há participação na construção do cenário futuro estamos conscientes de que a gestão de seu cotidiano é tão importante quanto sua concretização. Há um conceito na imaginação, no desenho, no plano e no projeto, que os renascentistas chamavam de adequação, uma capacidade de encaixe de proporções do todo e das partes do cenário proposto com o contexto existente. Um certo equilíbrio entre ética e estética.

A pretensão aqui é restaurar o caráter da arquitetura e do urbanismo como arte, entendida como força presente e sintética que coohabita com suas premissas; funcionais, ideológicas e construtivas. Neste sentido, a palavra arquitetura é esclarecedora quando dissecada, estando seu significado ligado a uma dualidade enriquecedora e potencializadora;
“Assim precedendo ao termo tektonicos (carpinteiro, fabricante, ação de construir, construção) acrescentou-se o radical arche (origem, começo, princípio)...A arche é o centro da esfera social daquele Mundo, e deverá ser traduzida nos edifícios, apresentando os deuses, a história e o espírito ético do povo grego.”[2]
O conceito de arche, princípio equilibrado do universo, ponto de equilíbrio entre o homem e o kosmos, como um signo síntese da ordenação do mundo pelo homem é a chave que abre para nós a compreensão das várias sensibilidades, que irão construir a idéia do homem moderno. A arche é um conceito que está além da materialidade do edifício, mas que só é possível ser desvendado pela sua própria materialidade. Como um mundo que a transformação humana da natureza torna visível quando é desempenhada com preocupação estética, portanto distinto da simples construção. Encontra-se neste conceito uma tríade explicadora; primeiro uma volta a origem, segundo uma unidade ordenadora e por último, uma expressividade que dá visibilidade ao mundo específico que a ele está vinculado.


1.2.1 Princípio Geral:
A. Inclusão e celebração da diversidade
A inclusão é o maior desafio das cidades brasileiras, que possuem um passivo histórico de contínua exclusão de pessoas e áreas, que permanecem como guetos da pobreza, desassistidos das infraestruturas mais básicas. Afinal, uma das características mais marcantes de nossa sociedade é a marcante concentração de renda. De uma maneira geral, nossos políticos e nossas políticas ainda não despertaram para o fato de que a distribuição territorial da população pode ser um fator capaz de distribuir oportunidades, e portanto renda. O simples acesso a uma centralidade mais fortemente constituída, pode significar a frequência em equipamentos culturais e ou educacionais de boa performance, mudando de forma substancial a perspectiva de populações vulneráveis. A simples implantação de saneamento básico em certas localidades afasta de maneira significativa a ocorrência de doenças como desarranjo e difteria, que podem nos primeiros anos de vida significar comprometimentos definitivos na capacidade cognitiva de indivíduos.
A diversidade é didática, atesta tal fato a estratégia adotada pelas universidades norte americanas, que há anos fazem um esforço sistemático para reunir na mesma sala de aula alunos de diferentes procedências e nacionalidades, na expectativa de que suas vivências compartilhadas formem uma massa crítica. A excelência da universidade norte americana possui um dos seus pilares nessa pré determinação, que possibilita uma vivência de compartilhamento de experiências, que acaba produzindo um aprendizado, onde a passividade dá lugar ao ativismo. A própria experiência da nação norte americana[3], que baseou seu desenvolvimento na atração de diferentes nacionalidades, e durante a passagem do século XIX para o XX representou uma promessa para a imigração de todos os povos. De certa forma, o Novo Mundo, da América em sua totalidade também representou esse local de forma emblemática, um local onde as oportunidades estavam abertas para pessoas do oriente e do ocidente. As operações urbanas precisam encampar esse objetivo, incentivando o intercâmbio entre diversidades
A pedagogia de Paulo Freire, também aponta no mesmo sentido, a diversidade é didática, capacitada de nos fazer relativizar nossos valores, e portanto produz um impulso didático de relativização dos nossos valores. A teoria dialógica de FREIRE 1970 aponta a premissa básica do diálogo entre experiências de qualquer procedência como operação didática, contraposta a concepção bancária da educação, que não gerava autonomia do pensar, mas dominação e colonização. Há aqui um nivelamento importante entre as culturas do colonizador e colonizado, do centro e da periferia, numa nova proposição de relação entre professor, aluno e sociedade. Trazer esses valores para a ordenação do espaço físico das cidades, dos bairros e vizinhanças imediatas é restaurar o sentido inicial das aglomerações humanas, onde a diversidade é didática.
B. Identidade e ampliação da auto-estima (matriz portuguesa de nosso espaço)
Por outro lado, é fundamental rearticular a ideia de ser e lugar, como um constructo que reúne consciência, auto-estima, vizinhança, e mobilização. Nessa questão, o conceito de analogia é fundamental para estruturar as demandas dos usuários e moradores, que muitas vezes estão presos a um cotidiano tão devastador, que não conseguem superar seu horizonte muito restrito de possibilidades. ROSSI utilizou o conceito de cidade análoga para definir a importância que a memória coletiva dos cidadãos pode desempenhar no processo de eleição do novo desenho da cidade. Inspirado nas pinturas de Canaletto, a metodologia da cidade análoga era uma operação compositiva de base surrealista, que a partir de algumas demandas tentava oferecer uma nova realidade. A analogia demanda sempre uma correspondência, ou uma identidade que um coletivo humano compartilha a partir de uma mesma base cultural comum. Aqui, essa base é nossa matriz portuguesa de cidade, e mais especificamente no caso do Rio de Janeiro sua interligação análoga com Lisboa. Sempre reafirmando a diversidade presente em Lisboa e no Rio de Janeiro, como metrópoles plurais, que não se restringem a uma única face, mas a uma grande gama de implantações, e portanto personalidades.
Importante salientar, que não se trata de uma operação que se refere a modelos conservacionistas e protecionistas, pois apesar do reconhecimento da matriz única – portuguesa -, o referencial aponta não apenas para o restabelecimento, mas possui pretensões evolutivas e adaptáveis, que são demandadas pela vida contemporânea. ROSSI(1979) e também TAFURI(1981) sempre manipularam a história não em seu sentido descritivo e de diagnóstico, mas em seu potencial propositivo, formulador de um prognóstico, capacitado a potencializar o projeto, portanto o seu vir-a-ser.

1.2.2 Princípios Norteadores:


A. Cidade Densa e Compacta, que revaloriza seu patrimônio já construído. Tolerância zero com a ampliação da mancha urbana.

Há nessa questão um imenso desafio, impedir a reprodução da cidade brasileira, combatendo sua dispersão interminável envolve a mudança de mentalidades e idealizações profundamente arraigadas na sociedade. O bem viver socialmente compartilhado e instalado envolve uma habitação isolada, unifamiliar, próxima a um idílio natural, sem proximidade de vizinhos. Essa condição foi alcançada a partir da hegemonia da cidade norte americana no mundo, que passou a representar para o senso comum o padrão do bem viver. Essa hegemonia cultural americana, que emerge a partir do final da primeira grande guerra é um fenômeno complexo, que foi analisado pelo filósofo italiano, Antonio Gramsci, nos Cadernos do Cárcere, conjunto de manuscritos produzidos na prisão fascista, a que foi submetido.

Nesse contexto, a ascensão da hegemonia norte americana no mundo, com o reforço do individualismo, o combate ao associativismo de classe, a regulação puritana dos hábitos sexuais e alcóolicos do operariado, e também os altos salários e a concessão de benefícios sociais, que caracterizaram o fordismo foi também anunciada. No caderno 22, o filósofo da Sardenha aborda o Americanismo e o Fordismo, para entender a emergência daquilo que classificava como, "a formação social capitalista mais avançada" da sua contemporaneidade. O final da primeira guerra mundial assinala a ascensão do domínio dos EUA no mundo, tal fato terá reflexos políticos, culturais e econômicos para a história do século XX. Gramsci será um crítico dos costumes cotidianos conformados pelas ideologias dominantes, investigando o estabelecimento do senso comum na consolidação de hábitos e gestos naturalizados. O american way of life acabou conquistando mentalidades em diversas partes do mundo, inclusive na Europa, mudando nossa concepção compartilhada do que consideramos, o bem viver. Gramsci tinha uma visão crítica sobre o americanismo e o fordismo, mas também vislumbrava uma potencialidade transformadora;


"O que hoje é chamado de americanismo é em grande parte a crítica preventiva dos velhos estratos que serão descartados pela possível nova ordem, e que já estão tomados por uma onda de pânico social, de dissolução, de desespero, que é uma tentativa de reação inconsciente de quem é impotente para reconstruir e alavancar os aspectos negativos da transformação. Não é de grupos sociais condenados pela nova ordem que se pode esperar a reconstrução, mas daqueles que estão criando, por imposição e com o próprio sofrimento, as bases materiais desta nova ordem. Esses devem encontrar o sistema de vida original e não de marca americana, para tornar liberdade o que hoje é necessidade." GRAMSCI 2008 página89

No campo da arquitetura e do urbanismo essas consequências estão materializadas na forma humana de ocupar o território de nosso planeta, que perderam força a partir da crise do petróleo da década de setenta, mas ainda vigoram de forma atuante em diversas mentalidades, e continuam sendo naturalizadas em diversas partes do mundo. O rodoviarismo, que determinou e ainda determina a espacialidade de nossas cidades, com a ampliação das áreas dedicadas aos automóveis, a implantação de vias expressas, viadutos e obras que aumentaram o acolhimento ao deslocamento sobre pneus, penalizando a vida pública e o circular dos pedestres. Além disso, a cidade americana disseminou o paradigma da habitação unifamiliar de baixa densidade, próximo de idílios isolacionistas, os subúrbios mono funcionais, cercados por amenidades da natureza. As duas determinações, a hegemonia rodoviarista e a moradia unifamiliar isolada nas franjas da cidade, acabam representando um enorme esgarçamento do tecido urbano, baixando muito a densidade e a proximidade entre cidadãos. Essas representações do bem viver continuam fazendo a cabeça de contingentes expressivos da população contemporânea determinando fortes impactos ambientais, e custos excessivos para a universalização das infra estruturas urbanas.

Portanto, a inércia do mercado imobiliário, e o comportamento generalizado de nossa sociedade, que quando pensa em morar, imagina um retiro isolado e idílico próximo a natureza, com uma garagem cheia de automóveis. Tal atitude, determina o abandono de imensos vazios urbanos já infraestruturados, que precisam ser reocupados, para que começemos o enfrentamento do problema da universalização dos serviços urbanos, tais como; distribuição de água, coleta de esgoto, lixo, iluminação, redes de transportes, águas pluviais, calçamento, etc... Enfim, tudo que se constitui nas comodidades urbanas que desfrutamos nas áreas mais infraestruturadas, e, que demandam investimentos invariavelmente públicos ou gerenciados pelo espírito público. Quando a mancha urbana é dispersa e espalhada no território mais difícil será a presença de todas essas comodidades em todas as partes de seu território, por isso a cidade densa e compacta é muito mais adequada do ponto de vista ambiental.

A taxa de crescimento da mancha urbana da cidade metropolitana do Rio de Janeiro, apontada pelo arquiteto e urbanista Vicente Loureiro[4], coordenador da Câmara Metropolitana é da ordem de trinta quilômetros quadrados por ano, o que demonstra empiricamente a preferência, tanto do mercado, quanto da população pela conquista de novas áreas, ao contrário dos empreendimentos sobre antigos bairros. Portanto, a luta contra a expansão desenfreada da mancha urbana é difícil e deve ser enfrentada no âmbito da mudança de concepções e mentalidades particulares, do que representa o bem viver. Enquanto, o bem viver, para o senso comum, estiver representado pela unidade habitacional unifamiliar construída nas proximidades da natureza, dependente de uma mobilidade centrada no automóvel particular, continuaremos com a expansão criminosa de nossas cidades. Tal atitude, além de impactar fortemente o meio ambiente, também condena parcelas significativas da população a viver sem serviços que caracterizam a urbanidade.

A questão é complexa, e está cobrando da sociedade civil, dos empreendedores, e do poder público uma política de Estado, que seja capaz de conter a sedução dos novos empreendimentos imobiliários próximos a contínuos naturais. Tolerância zero com a expansão da mancha urbana. A proposição alternativa deve tentar cooptar e atrair atividades econômicas capazes de oferecer uma opção sedutora, por exemplo, o incentivo a implantação de chácaras e sítios produtivos, baseados na agricultura familiar, que produzam alimentos para o abastecimento da cidade metropolitana do Rio de Janeiro. Nesse quesito, o Rio de Janeiro sofre de grandes carências, recentes levantamentos nos informam que menos de 30% dos alimentos consumidos nas merendas escolares da cidade metropolitana são provenientes das franjas e limites da mancha urbana. O que nos indica, que há uma atividade econômica rentável capaz de fazer frente a especulação imobiliária predatória, e pouco sintonizada com um desenvolvimento mais amigável ao meio ambiente.

Além dessa atuação nas franjas e limites é necessário revitalizar e cuidar de forma adequada de nosso patrimônio construído, que possui exemplares expressivos nas diversas centralidades da grande aglomeração da cidade metropolitana do Rio de Janeiro. A transformação de usos de antigas estruturas deve ser incentivada, atraindo preferencialmente o uso habitacional, de forma a constituir centralidades polifuncionais, que se aproveitem das infra estruturas já presentes nesses contextos, garantindo movimento e vida cidadã, mesmo nos finais de semana. A densidade habitacional deve ser direcionada para os padrões já existentes em cidades concretas, tais como Paris, San Francisco, Lisboa, Nova York, dentre outras. Além da questão da polifuncionalidade, deve ser garantido o acesso às centralidades aos extratos mais fragilizados economicamente, buscando sempre uma vizinhança com diversidade de extratos sociais.

B.Habitação: Forma específica de morar típica de cada cidade. O morar articulado com a cidade. O morar carioca como celebração da vida pública. Densidade. Variedade de usos.
Construir, Habitar, Pensar como chamou a atenção HEIDEGGER(2015) são operações humanas, que se confundem com o ser, e com o ente. A habitação em uma existência além da impessoalidade e da coisificação transcende o mero abrigo e acaba representando o que somos. O arquiteto ROSSI (1995) no seu brilhante trabalho A arquitetura da cidade, também nos chamava a atenção de que as cidades acabam por gerar uma forma particular de habitar. Para ROSSI (1995) cada cidade condiciona uma forma de morar, pois os bairros, a vizinhança, o contínuo construído que dá suporte a existência urbana, constituem um morar urbano de forma indelével para cada localidade. Essa personalidade do lugar é conferida pela história do desenvolvimento do aglomerado, que sempre é particular, e atravessa momentos onde uma diversidade de sensibilidades acabam por se manifestar de forma única. Assim a bélle epoche carioca, com sua vontade de reproduzir Paris nos trópicos é uma manifestação muito particular da então capital do Brasil, o Rio de Janeiro. Essa sensibilidade se junta ao contínuo colonial, neo-clássico que a precede e ao contínuo proto-moderno, modernista, e contemporâneo que a sucede, gerando uma tipologia do habitar única e particular.

A cidade de matriz portuguesa, possui suas características particulares, nela sempre se manifestou a interdependência entre o habitar e a cidade, isto é, o conjunto de comodidades que suportam o morar, como padarias, restaurantes, vendas, cafés, bancos, serviços, etc.. Na sua matriz mediterrânea, mais ampla, percebemos invariavelmente uma forte interconexão entre habitar e diferenciados serviços e usos que lhe dão suporte. A habitação corresponde a oitenta por cento do uso presente em nossas cidades, por suas características de negação de uma certa sazonalidade, os contínuos de moradia acabam determinando usos e apropriações diferenciadas. Portanto, com uma política habitacional estruturada é possível fazer cidade, ou reformar a cidade pré existente, dando densidade existencial às vizinhanças, a partir do reconhecimentos de suas partes e diferentes demandas. No Rio de Janeiro, como em outras grandes metrópoles há uma diversidade de partes, com personalidades diversas, que acabam representando particularidades do habitar. O reforço dessa identidade particular deve ser a premissa fundamental da imaginação, do desenho e do projeto da intensificação da densidade habitacional nessas localidades. Os novos empreendimentos devem se aproximar de pré existências reforçando densidades habitacionais, mas respeitando características como escala, textura, dimensões de forma a alcançar uma vizinhança com diversidade.

Para tal, é fundamental articular programas de operações urbanas; urbanização de favelas, construção de novas unidades habitacionais, requalificação do espaço público (calçadas e vias), inserção de mobilidade, aproximação com conjuntos naturais, etc... Todas essas operações se retroalimentam e se complementam gerando tanto a densidade do habitar sugerida por HEIDEGGER (2015), como a diferenciação das diversas partes da cidade. Aqui é fundamental o monitoramento do poder público, principalmente no que se refere ao valor da terra urbana, suas parcelas ideais e sua eventual sobrevalorização por sua própria qualidade. Mecanismos, já consagrados no mundo, presentes no Estatuto das Cidades, mas pouco usados por nossas administrações públicas, por conta da cultura ibérica patrimonialista precisam ser utilizados, como; o Direito de Preempção, a Contribuição de Melhoria, o IPTU progressivo e outros.

C. Mobilidade: Hierarquia dos modos. Saúde e mobilidade. Rodoviarismo x Calçadas Amigáveis
A mobilidade na cidade precisa ser encarada como um sistema complexo e articulado, que pretende garantir a toda a sua população o amplo acesso a todas as partes de seu território de forma mais rápida, e com uma tarifação acessível. Aqui é fundamental a legibilidade compartilhada por todos da integridade do sistema, que parte dos troncais de mais alta capacidade até os deslocamentos mais corriqueiros como as calçadas. O sistema deve ser unificado permitindo que seu acesso seja feito por um cartão único e universalizado, que garanta ao passageiro seu amplo acesso a todos os modais, sejam eles de movimentação objetiva ou contemplativa.

A oferta dos sistemas interage fortemente com variáveis como valor da terra urbana, oferta de oportunidades de emprego, de lazer, de cultura, de educação, devendo privilegiar os extratos mais fragilizados economicamente, de forma a garantir a esses a possibilidade de superar sua condição. A mobilidade é portanto fator fundamental para promoção de uma melhor distribuição de renda, e portanto deve ser gerida pelo poder público para alcance desse objetivo.

A mobilidade deve incluir na sua lógica a promoção da saúde, fomentando movimentações que incentive deslocamentos que possibilitem exercícios físicos, caminhadas a pé e pedaladas em bicicletas compartilhadas ou não devem ser incentivadas. A adoção de racks de carregamento de bicicletas em todos os modais devem ser incentivada, sem qualquer cobrança, incentivando um deslocar dinâmico e promotor de saúde.

O uso do automóvel individual – o rodoviarismo – deve ser desestimulado em várias frentes tais como, redução das faixas de rolamento em vias, ampliação de calçadas e comodidades de travessia, revogação da oferta de vagas de veículos em empreendimentos imobiliários próximos dos modais de alta capacidade, etc... A cidade brasileira e o Rio de Janeiro precisa reverter sua tendência de investimentos massivos em pistas de rolamentos, que invariavelmente se mostram saturadas no curto espaço de tempo. O transporte público de alta capacidade precisa ser glamourizado pretendendo construir uma consciência civilizatória na intensificação de seu uso, pistas de circulação de automóveis devem ser suprimidas para dar lugar ao transporte coletivo.

D. Natureza e cidade:
Por último, a questão da presença de contínuos naturais no seio da grande cidade deve ser estimulada, para que a população tenha consciência e se aproxime das dinâmicas da sua evolução e variação ao longo dos seus ciclos. Nesse campo, a cidade do Rio de Janeiro possui um imenso patrimônio natural, e apresenta uma situação única e inusitada frente a outras aglomerações, devendo ampliar essa condição de forma a produzir corredores naturais. A presença da Floresta da Tijuca, do Maciço da Pedra Branca, da Floresta do Tinguí, do Morro do Estado, das lagoas de Jacarepaguá, da Rodrigo de Freitas, de Piratininga e de Camboriú, das Baías de Guanabara e de Sepetiba fazem dessa aglomeração humana um caso único de metrópole selvagem e natural. Onde uma série de contínuos naturais convivem com a vida urbana, muitas vezes amenizando as tensões da vida cotidiana, e oferecendo possibilidades de lazer notáveis a sua população.

A recuperação de antigos mananciais e rios que foram canalizados e escondidos pelo desenvolvimento da grande cidade devem ser reexpostos e reapresentados as suas vizinhanças, mesmo que envolvam a supressão de obras rodoviárias. Os rios são elementos dinâmicos em nossa paisagem, e sua exposição numa cidade tropical úmida como o Rio de Janeiro são importantes para que a população entenda a dinâmica de seu funcionamento ao longo do ano. As estações secas e chuvosas, a importância da vegetação em suas margens, o cumprimento das Faixas Marginais de Proteção (FMP) serão fatores de criação de amenidades para sua população, e terão um valor didático para compreensão dos ciclos naturais, desvendando muito das precariedades hoje existentes tanto no saneamento, quanto na coleta de resíduos sólidos.

A despoluição da Baía de Guanabara deve assumir um caráter central nesse ponto do envolvimento e da interação entre cidade e natureza. A obtenção da balneabilidade nesse imenso acontecimento natural, de grande valor histórico e simbólico para a cidade pode representar para diversificados bairros e municípios a obtenção de valorização e contínuos de lazer qualificados. Essa despoluição também deverá enfrentar as condições insalubres de uma série de corpos hídricos, que constituem sua bacia, estendendo os benefícios da descontaminação a um amplo território desassistido da atual metrópole.
NOTAS:
[1] COUTINHO 1979 página 42. Aponta uma forma de operar autocrática e pouco democrática de nossa oligarquia como a via prussiana, numa analogia com os processos de unificação da Alemanha.
[2] BRANDÃO (1991) página 22
[3] TOTA (2009) página 122. Entre 1901 e 1920, os Estados Unidos receberam cerca de 15 milhões de imigrantes.
[4] Coordenador da Câmara Metropolitana, organismo que congrega 21 municípios que compõe a cidade metropolitana do Rio de Janeiro.

BIBLIOGRAFIA:
BRANDÃO, Carlos Antonio Leite Brandão – A formação do homem moderno vista através da arquitetura – editora Ap Cultural 1991 Belo Horizonte. Pg 22


COUTINHO, Carlos Nelson - A democracia como valor universal - acessível no site https://www.marxists.org/portugues/coutinho/1979/mes/democracia.htm
FREIRE, Paulo – A pedagogia do oprimido – Editora Paz e Terra Rio de Janeiro 1970
GRAMSCI, Antonio - Concepção dialética da história - editora Civilização Brasileira Rio de Janeiro 1966


HEIDEGGER, Martin- Construir, Habitar, Pensar – Oficina de Artes y Ediciones Madrid 2015
MOREIRA, Pedro da Luz – Projeto, Ideologia e Hegemonia, em busca de uma conceituação operativa para as cidades brasileira – Tese de Doutorado apresentada no PROURB em 2007


ROLNIK, Raquel – Guerra dos Lugares: a colonização da terra e da moradia na era das finanças – Boitempo São Paulo 2015
ROSSI, Aldo – A arquitetura da cidade – Editora Martins Fontes São Paulo 1995


ROSSI, Aldo – Para uma arquitetctura de tendência, escritos 1956-1972 – Editorial Gustavo Gilli Barcelona 1977
SAFATLE, Vladimir - Só mais um esforço - Três Estrelas São Paulo 2017

SINGER, André - Os sentidos do lulismo, reforma gradual e pacto conservador - Editora Companhia das Letras São Paulo 2009
TAFURI, Manfredo – Teorias e História da Arquitetura – Editora Presencial Lisboa 1981

TAFURI, Manfredo – The Sphere and the Labyrinth, avant-gardes and architecture from Piranesi to the 1970,s – MIT Press Bosto 1987

TOTA, Antonio Pedro – Os Americanos – Editora Contexto São Paulo 2009




terça-feira, 19 de fevereiro de 2019

Verdade, pós verdade e fatos

No dia 16 de janeiro de 2019, na sala do Conselho de Informações da Cidade do Rio de Janeiro, no Instituto Pereira Passos (IPP) foi apresentada a palestra do professor Paulo de Martino Jannuzzi, com o tema Política e Produção de Estatísticas. O professor Paulo Jannuzzi leciona no Programa de Pós Graduação em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas (ENCE/IBGE), e trouxe um panorama da ciência da estatística, como construtora de uma política sistemática de promoção da equidade em nossa sociedade. A partir de argumentos justificadores da estatística como construtora e balizadora dos parâmetros de equidade do Estado de Bem Estar Social, de longa construção nos países desenvolvidos, e, de mais tardia adoção entre nós é formulado a tese de combate ao relativismo do mundo da versão, ou da pós verdade. As redes sociais e uma quantidade imensa de informações, sem parâmetro anterior na história, lançaram a humanidade num mundo que muitos caracterizam como, a pós-verdade. É claro, que a compreensão do perfil demográfico da população do Brasil tem na ciência estatística um poderoso instrumento para seu auto mapeamento fatual. No entanto, uma crescente influência da "versão" ou "opinião", não baseada em estudos aprofundados em fatos permeia o nosso mundo das mídias sociais, e consegue atingir a mídia institucionalizada, generalizando-se numa desinformação perigosa. Aquilo, que o professor Jannuzzi chamou de uma certa "midiotização" da sociedade contemporânea, que impacta fortemente a construção do senso comum, direcionando-o de forma perversa para interesses oligopolizados.

"O Brasil seria diferente do que é hoje se não fossem as informações produzidas pelo IBGE e por outras instituições do Sistema Estatístico Nacional. Com todas as iniquidades sociais que ainda persistem no país, o quadro seria seguramente pior caso não houvesse informações estatísticas levantadas há mais de 80 anos ou quase 150 anos, se forem considerados os esforços de realização do primeiro Censo Demográfico em 1872, no final do Império, quase 20 anos depois do planejado, pelas resistências da elite latifundiária e escravocrata da época." JANNUZZI, Palestra no IPP janeiro de 2019

Coeficiente do Indice de Gini de Rendimento Domiciliar 
Per Capita da População
Os exemplos selecionados por Jannuzzi envolvem manchetes concretas dos mais importantes jornais brasileiros, como O Estado de São Paulo, O Globo, e Folha de São Paulo, aonde são destacadas; no primeiro jornal em 15 de setembro de 2018 "Mais Educação do MEC não melhora notas dos alunos", ou no segundo em 25 de setembro de 2015, "Pronatec é irrelevante para o mercado", ou ainda na Folha em 16 de abril de 2018, "Filosofia e Sociologia obrigatórias derrubam notas de matemática". Nenhuma dessas manchetes podem ser comprovadas pela evolução das estatísticas brasileiras, ou nos fatos, que na verdade mostram o contrário, um declínio tímido de alguns parâmetros de medição da desigualdade, e uma melhora tímida na educação. Como por exemplo, o Coeficiente do Indice de Gini de Rendimento Domiciliar Per Capita da População (gráfico acima), que mede a desigualdade no país, e espelha uma melhor distribuição na medida que se aproxima de zero. Em 1982  esse Coeficiente era de 0,582, piorando em 1983 passando a ser de 0,606, a partir desse momento decresce, primeiro de forma mais tímida até 2001, quando alcança 0,591. A partir de 2002 decresce de forma mais forte, partindo de 0,588 e chegando em 2014 a 0,514. Mas apesar desses números permanecem pipocando "versões"  e "opiniões", que repetem que os governos PTistas não distribuíram renda. Na verdade, as políticas de esquerda foram tímidas, mas efetivas distribuidoras de renda. Apesar disso, os delírios e arbitrariedades estampados chegam a índices mais aviltantes, quando se olha para a mídia como um todo, afinal a manchete do jornal O Povo on line, de 13 de março de 2017 estampava a seguinte fala do candidato a Deputado Federal Victório Galli (não eleito) do PSL do Mato Grosso do Sul; "Deputado Federal chama Mickey de homossexual, e acusa Disney de promover o gayismo". Talvez, no campo da liberação dos costumes, as proclamações definitivas desvinculadas dos fatos medidos pelas estatísticas é então mais contundente, pois a aceitação passa a permitir uma maior auto declaração, assustando as ideologias conservadoras. Há clara presença de alguns fatores perversos no Brasil, que impulsionam tendências da midiotização das mensagens, tais como; oligopolização das empresas de comunicação do país, falta de regulação sobre a responsabilidade de conteúdos ofensivos e falsos.

"Midiotização das Políticas Públicas: cobertura pouco profissional e cuidadosa das Políticas Públicas, de sua relevância, dificuldades de implementação e efeitos pelos veículos de comunicação, influenciando sua legitimidade social e sustentação política." JANNUZZI, Palestra no IPP janeiro de 2019

Carga tributária histórica nos países da OCDE
Na verdade, a construção do conceito de Estado de Bem Estar Social é muito recente, emergindo a partir do segundo pós guerra no mundo, que passou a operar com uma carga tributária maior para sustentar políticas sociais de inclusão da pobreza. Os gráficos, apresentados por Jannuzzi mostram de forma clara, o aumento da carga tributária em diferentes países do mundo, que impulsionaram a promoção de políticas sociais de inclusão e de combate a pobreza. No Brasil, diferentes pesquisas apontam que uma mudança social tímida decorreu de uma série de fatores, que aconteceram em nossa história recente, tais como; um pacto progressista instituído pela Constituição de 1988, democratização e estabilidade política após a queda da Ditadura Civil e Militar, boom das commodities, decisões econômicas em favor do mercado interno, fortalecimento de políticas sociais universais voltadas à equidade e a públicos vulneráveis, informação e avaliação da efetividade dos programas.

Com a ascensão do modelo neoliberal no mundo, primeiro com a ascensão de Thatcher e Reagan, no âmbito anglo-saxão, no final dos anos setenta e inicio dos oitenta, e depois no restante do mundo emerge então uma estabilização da ampliação da carga tributária em vários países. A alegação é sempre a mesma, que a carga tributária se ampliou de tal maneira, dificultando o livre movimento das empresas e dos investimentos, dificultando a promoção do desenvolvimento. Mas na verdade, a desregulamentação que estabilizou a ampliação da carga tributária vem dando demonstrações repetidas de concentração de renda e aumento das desigualdades. No Brasil, as perspectivas apresentadas por Jannuzzi apontam uma clara tendência de queda da carga tributária, sem que os benefícios de políticas estatais tenham sido universalizados. O discurso de que temos uma carga tributária alta, sem termos um nível de excelência de serviços públicos parece que saiu vencedor na última eleição majoritária no país, sem que tenha sido oferecido uma alternativa fatual para o alcance desse grau. Na verdade, a escolha parece desconsiderar que o país precisa melhorar sua divisão de renda, e, que a maneira construída pelos países ocidentais centrais do capitalismo de ampliação da carga tributária, me parece ainda não foi refutada. Nesse sentido, o gráfico acima, mostrado por Jannuzzi é esclarecedor, comparando as cargas tributárias de países europeus como Espanha e Portugal, com latino americanos como Argentina, Chile, Méxiso e Brasil.

Toda a ascensão de governos alinhados à direita, nos últimos anos pelo mundo parece apontar uma tendência de retrocessos numa série de campos, tais como; o cosmopolitismo global, o Estado laico, a aceitação da diversidade de costumes e opções sexuais, e a carga tributária dos Estados. Um ponto, que esse blog vem repetindo de forma recorrente em suas publicações é o da presença de uma certa hegemonia do Capital Financeiro, que me parece se articula de forma interessada com o mundo da pós-verdade. Uma vez, que os costumes cotidianos especulativos das bolsas e do rentismo, me parece, se articulam muito mais com as "versões", do que com os "fatos".

BIBLIOGRAFIA:

JANNUZZI, P. M. - Apresentação ao Conselho do IPP em 16 de janeiro de 2019 - apresentação disponibilizada pelo IPP

JANNUZZI, P. M. -  Monitoramento e avaliação de programas sociais: uma introdução aos conceitos e técnicas.- Editora Alínea, Campinas 2016.

JANNUZZI, P. M. - Indicadores sociais no Brasil: conceitos, fontes de dados e aplicações. - 6. ed. rev. e ampl. Editora Alínea, Campinas 2017.


quarta-feira, 13 de fevereiro de 2019

O bairro de Santa Teresa, suas peculiaridades e potencialidades

Um dos exemplares da tipologia arquitetônica do bairro, que 
demonstra a profusão de torres e minaretes captando vistas
inusitadas. O Castelo Valentim, segundo alguns, obra de
Lucio Costa, nos seus anos de juventude, antes de aderir ao
movimento moderno
Toda grande cidade, no mundo apresenta uma diversidade de peculiaridades, e partes com fortes personalidades diferenciadas, que se constituem como sua riqueza, que irá propiciar e promover uma grande variedade de maneiras de viver e se comportar. O bairro de Santa Teresa é um desses lugares, que fazem parte da imensa diversidade do Rio de Janeiro. A riqueza das opções faz parte dessa capacidade de toda grande cidade abrigar diferentes mentalidades, crenças, comportamentos e atitudes, gerando e promovendo diversidade cultural. A cidade contemporânea e especulativa tende a gerar partes e bairros homogêneos, uma vez que as diferenças tendem a gerar uma certa ansiedade, quando nos defrontamos com ela.  É claro também, que a cidade capitalista estratifica essas escolhas entre suas partes entre diversos extratos sociais, mas os bairros de uma maneira geral, que apresentam maior vitalidade são exatamente aqueles que oferecem diversidades de uso e renda. Por outro lado, as diferenças não se restringem a um padrão de renda, mas envolvem diversidades como; crenças, etnias, opção sexual e outras. No mundo contemporâneo há uma tendência ao tribalismo e uma certa vertente de classificação estereotipada dos grupos sociais, que me parece o bairro de Santa Teresa claramente contraria. Portanto, partes da cidade do Rio de Janeiro, como Santa Teresa contrariam uma regra básica da cidade especulativa; a segmentação de classes sociais, nas suas diversas partes, abrigando um certo cosmopolitismo diverso.

Nesse sentido, há nesse bairro uma incrível diversidade de extratos sociais, e diferenças inclusive na sua articulação internacional, a partir da recorrência de determinados hotéis boutiques de diárias caras na sua trama de ruas. Além dessa presença há uma rede de estrangeiros instalados no bairro, que volta e meia atraem um novato, que se encanta por suas particularidades, e se instala. Mas muito além da presença dos estrangeiros, há em Santa Teresa a presença de uma grande quantidade de favelas, pequenas e grandes, que garantem a convivência com extratos sociais mais populares, que fazem a fortuna do local. Afinal de contas, nada mais entediante do que a homogeneização social promovida pela cidade especulativa. Mas, também há uma clara carência; a ausência de comércios, transportes e serviços diversificados daquelas partes da cidade que gozam de maior grau de centralidade, trazendo um ar provinciano e num paradoxo, pouco cosmopolita ao bairro.

Há um certo distanciamento montanhês nessas paragens, e um certo distanciamento folclórico das altas temperaturas típicas do verão carioca, que não correspondem aos fatos. Na verdade, nos curtos períodos do inverno carioca, Santa Teresa realmente apresenta a maior recorrência de temperaturas mínimas da cidade, mas no verão, também disputa com Bangú, as suas máximas. Mas o isolamento acaba sendo um dado construído pela morfologia de seu relevo, que se diferencia fortemente das áreas de baixada, que constituem a maior parte da cidade do Rio de Janeiro. A topografia é uma forte presença no bairro determinando o lançamento das ruas, a sua divisão fundiária dos lotes, e portanto, sua arquitetura. Há um tema recorrente na tipologia arquitetônica do bairro, as torres e minaretes que enquadram vistas emblemáticas, desde o castelo Valentim, que segundo alguns nasceu da prancheta do doutor Lucio Costa, o autor de Brasília, em sua fase eclética da juventude, até a residência de Benjamim Constant, os observatórios pontuam a paisagem do lugar de forma determinante.

Esse mesmo relevo vai determinar o traçado orgânico de suas ruas, vielas e escadas que sobem os contra fortes da Floresta da Tijuca, volta e meia no ambiente agora público enquadram vistas da zona sul, centro e norte magníficas. Um velho tio-avô meu, que nasceu no bairro, e era embaixador do Brasil, tendo representado o país em Cabo Verde, Boston, Argélia e Japão dizia que mais que Monmartre em Paris, Santa Teresa lembrava Lisboa, e seu bairro da Mouraria. Sem dúvida, há uma forte analogia com o bairro Lisboeta, que possui o mesmo encanto das perspectivas seriadas, que apenas são descobertas enquanto nos movimentamos. A escala das ruas demanda uma velocidade no bairro, para fruição de sua complexa arquitetura, que não deveria ultrapassar o limite de 30 Km/h, dos seus bondes, ou melhor das caminhadas sem destino certo.

O vetor principal de articulação do bairro, e sua espinha dorsal de legibilidade são as ruas Joaquim Murtinho e Almirante Alexandrino, que estruturam o bairro desde dos Arcos da Lapa até a Floresta da Tijuca, na subida para as Paineiras, Mirante Dona Marta e Corcovado. A origem desse eixo surge, ainda no século XVII, com a necessidade de coleta de águas do Rio Carioca para leva-las ao centro da cidade, no chafariz do Largo da Carioca, tanto que as ruas Joaquim Murtinho e Almirante Alexandrino tinham o mesmo nome até o século XIX; Rua do Aqueduto. E, correspondiam ao leito do canal de água desviado do Rio Carioca, na área hoje a montante da Favela Cerro Corá, um pouco antes do ponto final do ônibus 006. Local, que vem sendo restaurado pelo INEPAC, e que concentra uma série de obras de engenharia hidráulica, que remontam à época da construção do aqueduto e ao período de reflorestamento das encostas promovido por Dom Pedro II, quando a cidade vive uma crise hídrica sem precedentes. Esse eixo é o que confere legibilidade geral ao bairro, surgindo ao longo dele o Centro de Bairro do Largo dos Guimarães até o Curvelo, aonde se concentram a maior parte dos restaurantes e comércio local. Nos últimos tempos, houve uma clara gourmetização desse centro de bairro, que passa a ser exclusivo quase de restaurantes e cafés, enquanto há alguns anos atrás ainda abrigava um comércio mais variado e diversificado, como açougue, loja de materiais de construção e verdureiro. Tal tendência, certamente se instalou a partir da intensificação do turismo na cidade, fazendo com que os antigos e novos estabelecimentos do comércio de alimentação aumentassem seus preços de forma que não atendem mais a população do bairro.

O bonde elétrico de Santa Teresa, que atualmente parte do Largo da Carioca, usa os arcos da Lapa e se conecta na rua Joaquim Murtinho, e chega na rua Almirante Alexandrino no edifício Pereira da Silva, na altura do Silvestre é um claro animador do bairro. Vários comerciantes celebram a reimplantação do bondinho, como um importante acontecimento, mobilizador de passeios bucólicos para estrangeiros no bairro. Atualmente, o sistema atende gratuitamente a população do bairro, e cobra uma tarifa salgada dos estrangeiros, que pagam R$20,00 por uma viagem do Largo da Carioca ao Silvestre. Há ainda um ramal que não foi reinaugurado, que liga o Largo da Carioca ao Largo do França na Paula Matos, e que é de suma importância para esse outro eixo comercial do bairro, pois desempenha esse mesmo papel, nesse recorte. Esse sistema, que foi recentemente reformado, a partir do grave acidente de 28 de agosto de 2011, reforça o caráter da legibilidade do eixo Joaquim Murtinho / Almirante Alexandrino, como eixo estruturante. O sistema existe desde o século passado, primeiro puxado a burros, e depois eletrificado, e era segundo os moradores mais velhos do bairro, um primor de funcionamento. Vários depoimentos colhidos entre os idosos reafirmaram, que acertavam seus relógios pela passagem das composições. Nesse aspecto, é interessante destacar a independência do bairro, até a década de sessenta, com relação ao automobilismo e rodoviarismo, hoje hegemônicos em toda a cidade. Há testemunhos, arquitetonicamente materializados, que atestam essa independência antes da década de sessenta, tais como; o condomínio Terra Brasilis que oferece grandes apartamentos, de 600 metros quadrados, sem oferta de vagas de garagem. Fato que atesta, como já houve um tempo na cidade do Rio de Janeiro, em que suas elites usavam os sistemas públicos de mobilidade, compartilhando-os com as classes mais populares.

A proposta para esse sistema em funcionamento é extender a linha até a Estação da Ladeira do Ascurra, que era parada do trem do Corcovado no passado, reativando esse ponto, diminuindo a demanda de passageiros na Estação dessa linha no Cosme Velho. Essa proposta, quando instalada poderá dinamizar e ampliar o centro de bairro de Santa Teresa, atraindo novos serviços e comércios para o bairro, a partir de uma maior afluxo de turistas. Além disso, essa proposta pode representar uma diminuição expressiva no afluxo de vans ao Corcovado, que hoje em dia se constitui num sério gargalo da visitação a atração turística mais procurada da cidade. Nesse sentido, seria importante a instalação de novos modais ligando outros bairros a Estátua do Cristo Redentor, como por exemplo, um teleférico que ligasse o Jardim Botânico ao Hotel das Paineiras, dividindo a demanda com os trens do Cosme Velho, e as vans. Um outro ponto importante no bairro é a melhoria de suas calçadas, que sofrem com as pequenas dimensões, com a presença de um rodoviarismo arrogante, que volta e meia rouba espaço dos pedestres, e uma certa descoordenação na localização de postes de concessionárias - light, outros serviços e a rede de eletrificação do bonde - que também tornam o caminhar a pé, uma corrida de obstáculos. A diminuição da caixa de rolamento de veículos é possível em alguns pontos, e a coordenação entre concessionárias de serviços, na locação de seus postes melhorariam substancialmente essa condição. Além disso, o bairro se ressente de uma melhor arborização urbana, nessas mesmas calçadas, que certamente seria muito melhorada se as redes de fios fossem subterrâneas. Na verdade, o bairro de Santa Teresa é uma dessas preciosidades que a cidade do Rio de Janeiro possue, e que, precisa de novos investimentos no seu sistema de mobilidade para ampliar suas conexões e suas oportunidades, bem como nas suas calçadas, que representam a infraestrutura primeira para uma boa movimentação.