segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

A cidade de New Haven nos EUA e os suburbios americanos de casas

A cidade de New Haven ao norte de Nova York é a sede da famosa universidade de Yale, fundada em 1701 como uma dissidência de Harvard, e, é onde meu irmão Paulo mora. Numa bucólica casa de três pavimentos, no bairro de Beaver Hills. A casa é datada de 1928, e, é toda construída em madeira, no sistema construtivo tipo balloon framing que gerou uma infinidade de casas nos EUA. O sistema inventado em meados do século XIX transformou a casa unifamiliar acessível à classe média americana, generalizando uma forma de morar que irá conquistar o mundo todo, o subúrbio americano monofuncional. Apesar dessa pré moldagem o sistema permite uma infinidade de composições e expressões estilísticas, não havendo qualquer homogeneização e impressão de repetição entre as casas.

A implantação das casas em Beaver Hill, sem definição do lote
Os bairros americanos, que se generalizaram a partir do segundo pós guerra eram estruturados em torno da habitação unifamiliar, e não dispõe de equipamentos comerciais próximos, o único equipamento admitido é a escola básica. Com a hegemonia do automóvel a partir do segundo pós guerra passou-se a sua celebração, como única forma de se movimentar no território da cidade. As casas no bairro possuem uma interessante implantação, não havendo uma precisa definição de seu lote através de muros ou cercas. A testada frontal do lote não possui qualquer definição, o que transmite a ampliação da presença do verde no bairro, uma vez que há sempre generosos jardins pontuados por árvores de vários tipos. O fundo do lote de meu irmão não possui qualquer definição com seu vizinho confrontante. Aqui se manifesta uma clara diferenciação cultural entre o Brasil e os EUA, que me parece vai muito além da questão climática, a ausência de qualquer resguardo para a área do quintal, que na casa brasileira está sempre presente. A intimidade do quintal no Brasil se faz presente, como uma extensão da área social da casa, uma parte que a familia resguarda da vida pública. Nos EUA os quintais, os fundos das casas possuem uma definição extremamente fluída e indefinida, que acaba lhe dando um caráter mais público e exposto.

Por outro lado, a intimidade da casa também possui a típica descrição presente no livro de Gaston Bachelard A poética do espaço, se desenvolvendo em porão, térreo, 1o pavimento e sótão, num interessante gradualismo expressivo entre a escuridão e a luminosidade. No livro o filósofo das ciências francês  descreve a dialética entre porão e sótão de maneira poética, fazendo analogias entre nossa mente e aspectos das vivências espaciais da casa nesses dois estágios. O porão para Bachelard é a representação do nosso subconsciente, irracional e incontrolado, com suas áreas sombrias e mau iluminadas próximas da intransparência da terra e do subsolo. Já o sótão no alto da casa era a representação de nosso consciente, racional e dotado de auto controle, iluminado, de visão ampla, capaz de descortinar amplos horizontes. Na verdade na casa de meu irmão, o desnível entre a frente do terreno e os fundos desvenda para o quintal uma parte da fachada do porão, tirando um pouco dessa analogia. Mas como estamos no inverno e as temperaturas beiram os zeros graus, e a vida está aprisionada pela interioridade, acabando por reforçar essa dialética, que se faz presente.

Há muito que reflito, com meus alunos da EAU-UFF sobre as complexas relações que a cultura brasileira costurou entre a nossa tradição patrimonialista e a casa da familia. Os valores simbólicos envolvidos são imensos e complexos, não devendo ser reduzidos de forma linear e simplificadora. Os dois países são também imensos, havendo neles uma grande diversidade de tempos e culturas, mas a cultura da unidade familiar no Brasil é muito diversa da americana.

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