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Capa da Tradução portuguesa do Tratado Decem Libri de Arquitetura de Vitrúvio, tradução do latim de M. Justino Maciel |
A autora Petra Lamers-Schütze em seu livro Teoria da Arquitetura, do Renascimento até os nossos dias lista 13 Tratados sobre a arte de construir apenas na Itália, num período que parte do fundador Tratado do De re aedificatória de Leon Battista Alberti de 1452, até o Tratado de Guarino Guarini Architeture Civile de 1737. Se, levamos em conta apenas o período de vida dos escritores, e não a data da edição das diversas publicações o período reduz significativamente, pois parte de Alberti (1404-72) e chega a Guarino Guarini (1624-83). Mas, todos fazem alguma referência ao Tratado da antiguidade clássica escrito por Marco Vitrúvio Polião, Os dez livros da Arquitetura ou na acepção consagrada pelo Renascimento, De Architectura, do século II a.C. A grande contribuição do engenheiro militar Vitrúvio, que dedica seu tratado ao Imperador Augusto é a caracterização da arquitetura pautada entre três vertentes; firmitas (firmeza), comoditas (1) ou utilitas (comodidade e utilidade) e venustas (beleza). Interessante também assinalar que Vitruvio coloca entre seus axiomas a ideia de que; "Arquitetura é ciência", "architectura est sciencia". Danielle Bardaro (1514-70), um dos tratadistas renascentistas ou maneiristas desenvolve esse argumento no seu, I dieci libri dell´architectura di M. Vitruvio numa edição de Veneza de 1570, classificando a arquitetura nas ciências matemáticas, fazendo dela uma expressão da verdade. Mas, muito além desse debate o esforço de Vitrúvio me parece por caracterizar a arquitetura como uma linguagem construtiva, estruturada por um elemento fundamental na sua existência, a coluna. Os treze tratados de arquitetura do renascimento ao maneirismo mencionados por Petra Lamers-Schültze são:
1. Leon Battista Alberti (1404-1472) - De re aedificatória libri decem - Editado no Vaticano 1442-52
2. Antonio Averlino (Filareto) (1400-1465) - Codex Machliabechianus II, I, 140 - editado em Florença 1461-64
3. Francesco do Giorgio Martini (1439-1501) - Codex Ashburnham 361 - editado em Florença 1470-90 - Codex Saluzzianus 148 - editado em Turim 1482-86, e - Codex Machliabechianus II, I, 141 - editado em Florença 1489-92
4. Anônimo - Hypnerotomachia Poliphili, O sonho de Polifilio - editado em Veneza 1499
5. Fra Giovanni Giocondo da Verona (1433-1515) - M. Vitruvius per locundumsolito castigator factus, cum figuris et tabula ut iam legi et intellegi possit - editado em Veneza 1511
6. Cesare Cesariano (1476/78- 1543) - Di Lucio Vitruvio Pollione de Architetura - editado em Como 1521
7. Sebastiano Serlio (1475- 1553/55) - Tutte l´opere d´architettura et prospectiva - editado em Veneza 1619
8. Jacono Barozi da Vignola (1507-1573) - Regola delli cinque ordini d´architettura - editado em Roma 1562
9. Pietro Cataneo (1510 - 1571) - I quattro libri di Architettura - editado em Veneza 1554
10. Daniele Barbaro (1514-1570) - I dieci libri dell´architettura universale - editado em Veneza 1615
11. Andrea Palladio (1508 - 1580) - I quatro libri dell´architettura - editado em Veneza 1570
12. Vicenzo Scamozzi (1548-1616) - L´idea della architettura universale - editado em Veneza 1615
13. Guarino Guarini (1624 - 1683) - Disegni di architetura civile ed ecclesiastica - editado em Turim 1686 - Architetture civile 2 volumes - editado em Turim 1737
As chaves classificatórias do Tratado de Vitrúvio são muitas, mas todas pretendem reduzir o ato construtivo a uma língua manipulada pelos seres humanos na ordenação e constituição dos seus espaços construído. Vitruvio inaugura, ou melhor explicita a profunda dependência do ofício da arquitetura e do urbanismo ao poder; imperadores, reis, papas, patronato, etc precisam ser convencidos da justeza do construir. E, muitas vezes serem seduzidos, que essa adequação precisa ser cultivada pelo poder, fazendo uma demonstração de suas intenções cultas, justas e sofisticadas sem ostentação. Apesar dessa doutrinação com claros pressupostos civilizatórios, a arquitetura e o urbanismo demonstram em sua fundação, nesses posicionamentos, um claro vínculo com o poder instituído. Giulio Carlo Argan, o crítico de arte e arquitetura, que foi também prefeito de Roma destacava nos seus comentários do tratado dos Decem Libri;
“... distingue os tipos dos edifícios com relação as suas funções práticas e representativas; descreve até mesmo a figura moral e profissional do arquiteto, cuja a função é considerada essencial à estrutura do Estado. Demasiado romano para desaprovar a tradição pátria, reduz a “ordem” também a arquitetura etrusca, toscana, confirmando, assim, sua intenção de inserir a experiência estética grega na praxe construtiva etrusca e romana. Como gramático e filólogo, Vitrúvio deduz da viva linguagem da arquitetura grega uma morfologia e uma sintaxe, mas, exatamente porque as formas gregas se tornam uma espécie de léxico, podem adaptar-se a uma arquitetura que deseja ser sobretudo discurso, desenvolvimento articulado de elementos representativos e funcionais no contexto de uma cidade.” ARGAN 2003
(1) Alguns autores como BRANDÃO 2016, apontam a inserção do termo comoditas na tríade vitruviana ao tratado de Alberti, apontando que Vitruvio apontava apenas o termo utilitas
BIBLIOGRAFIA:
ARGAN, Giulio Carlo – História da Arte Italiana; da antiguidade a Duccio vol.1 - Editora Cosac & Naif São Paulo 2003
BRANDÃO, Carlos Antônio Leite - Arquitetura, Humanismo e República; a atualidade do De re aedificatoria - Editora UFMG Belo Horizonte 2016
BRANDÃO, Carlos Antônio Leite (org.) - Na gênese das racionalidades modernas; em torno de Leon Battista Alberti - , MALARD, Maria Lucia - Projeto Arquitetônico e Pensamento Científico - Editora UFMG Belo Horizonte 2013
LAMERS-SCHÜTZE, Petra - Teoria da Arquitetura, do Renascimento até os nossos dias - Editora Taschen Tóquio 2003
MACIEL, M. Justino - Tratado de Arquitetura de Vitrúvio - Editôra 1st Press Lisboa 2006
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