sexta-feira, 28 de fevereiro de 2020

Hoje meu filho especial Felipe completa 30 anos de idade

Hoje, dia 28 de fevereiro de 2020 meu filho especial Felipe completa 30 anos de idade. Felipe é autista não verbal, e apesar dessa condição se comunica de uma forma bastante peculiar, através de algumas ecolalias, que são a repetição de frases e palavras sem sentido. Uma das mais recorrentes, pelo menos comigo, é; "Cadê o Pinguim?" Uma pergunta meio surrealista, que sempre me remete ao isolamento das geleiras da Antártica dentro de um enorme grupo de pinguins, aonde Felipe parece condenado a só utilizar as formas de interação dessa ave meio particular e inusitada. A frase é claramente utilizada para chamar a atenção, quase como que fosse; "Oi estou por aqui." Há outras também, como; "Fecha a geladeira!" ou "No copo!", que se remetem a situações mais concretas de repressão a seus comportamentos como o de abrir a geladeira ou beber água nas garrafas.  O autismo é uma síndrome grave, que afeta o relacionamento social de determinadas pessoas, num amplo espectro de gravidade, que envolve capacidades variadas e diversos comportamentos de isolamento social. Em 30 de março de 2017 escrevi um texto aqui mesmo no blog sobre ele, quando já tinha 27 anos. O link é; 

https://arquiteturacidadeprojeto.blogspot.com/2017/03/meu-filho-cacula-felipe-e-autista.html.

Felipe não é violento, nem pratica auto mutilamento ou agressividade que alguns autistas apresentam, possuindo apenas alguns comportamentos repetidos e obsessivos, como pular e rir de forma aparentemente inusitada e inesperada. Apesar disso manifesta uma imensa capacidade de afeto e carinho, com as mais variadas pessoas, mais próximas ou nunca vistas. Suas maiores manifestações de violência estão invariavelmente direcionadas a seu irmão mais velho, Daniel, que me parecem expressões claras de ciúme, manifestações de sua consciência da fragilidade de sua capacidade de comunicação e interação pela falta da linguagem. Há aqui, uma presença confusa da consciência de suas limitações de linguagem, a afirmação do seu espaço essencial e uma competição originária ou inconsciente, que na verdade o perturba mais que o reconforta. Muitas vezes, após a ocorrência desses eventos conversei particularmente com êle de forma dura e repressora, fazendo-o muitas vezes chorar. Apesar dessa clara demonstração de arrependimento e reconhecimento das suas limitações, Felipe volta a repetir invariavelmente a ação, muitas vezes de forma inesperada, como uma reação involuntária e impensada.

Tudo isso é um grande mistério, e a nossa consciência das limitações e potencialidades dos comportamentos de Felipe e dos autistas em geral me parecem ainda campos inexplorados, que demandam da sociedade uma maior capacidade de convívio com o especial. Essa maior convivência e disponibilidade certamente representaria um significativo apuro civilizatório e pessoal de inteligência e sensibilidade nas pessoas. A convivência com o autismo, como já afirmado aqui nesse blog é um eterno aprendizado, principalmente de respeito a alteridade humana, que mesmo ao desfrutar de uma plena capacidade de expressão parece e pode sempre esconder mistérios. Muito além de uma funcionalidade prática, Felipe parece sempre nos lembrar, que há um manifesto em toda existência humana.

Feliz Aniversário, meu filho...

3 comentários:

  1. Tenho tido contato com alguns autistas filhos de amigos e percebo como é desafiador lidar com a mente. Parabéns pelo relato e pela perseverança. Um abraço
    Lucia Roma

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. É uma convivência que nos ensina muito. Há frustrações sem dúvida, mas também muita recompensa...

      Excluir
  2. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir