Na última quarta feira, dia 13 de novembro de 2013, um time variado de políticos, administradores e intelectuais discutiu a questão da mobilidade urbana nas cidades brasileiras. Uma das reinvindicações mais candentes das chamadas jornadas de junho, que tomaram as ruas das cidades brasileiras, como um rastilho de pólvora. As soluções dentro deste tema demandam planejamento e estruturação das ações sobre o território da cidade de forma pensada e articulada. O voluntarismo e a ansiedade por ações de impacto midiático, que se materializam em votos, e, que tanto caracteriza nossos homens públicos, neste campo pode representar um verdadeiro desastre. Transporte é sistema, é rede articulada de modais, que envolvem caminhar seguro, onde o pedestre deve ser privilegiado sobre todos os aspectos. Os diversos modais, como; bicicletas, ônibus, barcas, trens, metrôs, etc...precisam estar articulados a partir de uma hierarquia clara, entre modais de alta capacidade, que estruturam o território e modais complementares.
O debate se iniciou com a palestra do prefeito de Belo Horizonte, Marcio Lacerda, que defendeu a idéia de um planejamento mais estruturador, que garanta maior acerto e maior transparência para o vir a ser das cidades brasileiras. O prefeito de BH também mencionou que dos R$42 bilhões do orçamento municipal anual, R$ 24 bilhões estão sendo investidos em mobilidade, principalmente nos BRTs das Avenidas; Antonio Carlos, PedroII e Cristiano Machado. Marcio Lacerda também registrou o horizonte desejado para o futuro de BH; "Uma cidade policentrada e compacta no futuro, contraposta a atual que se encontra monocentrada e dispersa."
Carlos Eduardo da Secretaria de Transportes Municipal do Rio de Janeiro, iniciou suas reflexões mencionando os pré-requisitos que deveriam nortear um sistema de transportes público de qualquer cidade; rapidez, regularidade e conforto. Carlos Eduardo trouxe um comparativo interessante envolvendo a cidade de Londres, que possui uma rede de metrô e trens urbanos invejáveis, mas que transporta apenas 12% da sua população nos dois modais. Carlos Eduardo mencionou que o carro individual continua seduzindo fortemente as populações urbanas, mesmo onde existem transportes públicos vigorosos, como em Londres. A distribuição dos modais na cidade metropolitana do Rio de Janeiro, segundo o PDTU de 2002, envolve os seguintes indices; 50% ônibus, 10% vans, 17% automóveis particulares, 13% trens e metrô, e 10% a pé ou bicicleta. Dentre os dados apresentados pelo Secretário de Transportes, um se destacou como importante para uma reflexão mais aprofundada sobre os investimentos feitos pela cidade nesta área. A extensão da malha de trens urbanos da cidade metropolitana do Rio de Janeiro soma 270Km, dos quais 150Km estão no município sede. Esta malha de trens urbanos é significativa, e, se encontra subutilizada, pois não inspira confiança na população usuária. Segundo dados da Supervia esta malha transporta 600mil passageiros por dia, já tendo transportado na década de 60, 1,2 milhão de passageiros por dia. Tal fato demonstra muito bem que os investimentos nesta área ainda não possuem, no caso do Rio de Janeiro, a transparência desejada. Carlos Eduardo também mencionou a perspectiva de inauguração de dois sistemas de BRTs transversais aos sistemas radiais da cidade, o BRT Transcarioca e o BRT Transolímpico. O primeiro será inaugurado em 2014 e o segundo em 2016. Há ainda um terceiro corredor de ônibus tipo BRT, que deve ser inaugurado também em 2016, o da Transbrasil, que segue pelo leito da Avenida Brasil, chegando até o centro da cidade, na altura da Candelária, na Avenida Presidente Vargas. A previsão segundo o secretário de transportes é que estes ramais de BRTs representem uma redução de 26% da frota de ônibus circulando na cidade.
Após as colocações do secretário de transportes foi a vez de José Mascarenhas, presidente do Conselho de Infraestrutura da CNI apresentar suas considerações. O representante da CNI iniciou sua reflexão afirmando que o desenvolvimento dos países é interdependente do cotidiano de nossas cidades, segundo ele neste ano 600 cidades no mundo gerarão 60% do PIB mundial. A vida econômica e social das nações é decidida nas cidades. O Brasil possui hoje 85% de sua população morando em cidades. Em 2030, 91% da nossa população será urbana. Para José Mascarenhas falta ao país uma cultura do planejamento, que estruture nossas cidades de maneira a se obter uma melhor qualidade de vida, que acabará por construir uma governança mais transparente. Para o representante da CNI, a cidade brasileira deveria passar a perseguir os seguintes pontos. Em primeiro lugar, conter o seu espraiamento, que inviabiliza sua governança e supervaloriza a terra urbana. Em segundo lugar, é fundamental privilegiar o transporte público de alta capacidade, que deve ser a espinha dorsal da mobilidade. Em terceiro, buscar a construção de bairros auto-suficientes, reduzindo as necessidades de deslocamento no território urbano. Em quarto promover a urbanização de favelas e assentamentos precários, levando a estes infraestrutura e urbanidade. E, por último modernizar os instrumentos de planejamento das nossas cidades, buscando maior transparência para as decisões. José Mascarenhas concluiu defendendo a criação de um fundo monetário compatível e proporcional com o tamanho das cidades, que faria frente as demandas de obras destes organismos.
O presidente do IAB, arquiteto Sérgio Magalhães iniciou suas considerações defendendo a necessidade de se encarar o problema da mobilidade urbana de forma integrada com outras questões como habitação, escala, densidade, valor da terra, que estão sendo encarados no Brasil de forma segmentada e parcial. O fenômeno urbano é extremamente interconectado e complexo para ser reduzido a apenas uma dimensão. Para Sérgio Magalhães a forma da cidade induz, e ao mesmo tempo é induzida pelas opções que oferece para sua mobilidade. Três dimensões devem ser articuladas e pensadas de forma conjunta pelo sistema de projetos urbanos de nossas municipalidades; habitação, escala e mobilidade. A partir de 1960 percebe-se a emergência do pensamento rodoviarista no país, e o declínio do sistema de trilhos, tanto trens quanto bondes em nossas cidades. Esta atitude irá impactar fortemente as densidades de nossas cidades, fazendo-as mais espraiadas e dispersas, inviabilizando a presença dos serviços públicos na totalidade do espaço urbanizado. O arquiteto também apresentou um quadro comparativo com relação ao uso de crédito pelas famílias brasileiras para construção de sua moradia. Segundo o presidente do IAB, em 1945 eram 2 milhões de domicílios urbanos, em 2012 são 50 milhões, destes aproximadamente 80 % foram construídos com a poupança particular das familias, sem acesso aos mecanismos de crédito oficial. O crédito imobiliário no Brasil é dos mais baixos do mundo, enquanto nos EUA ele atinge 68%, no nosso país ele se restringe a apenas 2%.
Por último, falou o representante do Instituto Urbem de São Paulo, Philip Yang, que apresentou um interessante paradoxo presente em nossas cidades contemporâneas, segundo o qual a supressão de vias para carros não implica na piora do trânsito. Para comprovar tal fato, Philip mencionou a cidade de Seul, que recentemente suprimiu um viaduto de ligação expressa, trocando-o por uma via semaforizada, dotada de transporte público, que acabou por melhorar o sistema de circulação na região. Em contraposição, Philip também mencionou a imensa obra rodoviarista de Boston do Turn Pike, um túnel subterrâneo que substituiu um viaduto, com aumento do número de pistas para veículos particulares, que vive com problemas de engarrafamento. Para Philip Yang, no planejamento das cidades é fundamental a articulação de três instâncias de poder; o político, o econômico e o social. Philip concluiu apresentando uma proposta de supressão da oferta de vagas de estacionamento nas áreas centrais das nossas cidades, segundo ele tal atitude desestimularia o uso do carro e ampliaria significativamente a largura de nossas calçadas.
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