segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Publicado no O Globo de 26/10/2013 um artigo meu sobre arquitetura feia

O Conjunto habitacional no antigo terreno do Presídio
Frei Caneca
Foi publicado no jornal O Globo de 26 de outubro de 2013, um artigo meu sobre arquitetura feia. A matéria trazia alguns exemplos mencionados por outros colegas de edificações na cidade do Rio de Janeiro que não primavam pela beleza. Dentre eles o conjunto habitacional construído no terreno do antigo presídio da Frei Caneca, que prima pela inadequação ao contexto. A arquitetura do programa Minha Casa Minha Vida vem recorrentemente reproduzindo este tipo de implantação inadequada, que mais contribui para estigmatização, do que para a integração. No artigo menciono o caráter impositivo da arquitetura frente a outras artes, baseado num crítico italiano Bruno Zevi. Menciono também a cúpula de Santa Maria del Fiori em Florença, relembrando o cuidado e o debate que envolveu sua solução e concepção por um concurso público, vencido por Bruneleschi no século XIV. Abaixo a íntegra do artigo:

O que gera arquitetura feia? 

Ou melhor, o que faz a arquitetura inadequada diante de determinados contextos? Certamente um dos itens mais recorrentes nesta avaliação é a ausência de uma generosidade urbana, isto é, edifícios que não compreendem as complexidades da cidade e se posicionam de forma autista e alheia ao entorno urbano. 

Edifícios que não compreendem que a fruição do espaço pelo ser humano não sofre descontinuidade entre interior e exterior, mas que representa uma só continuidade. O crítico italiano Bruno Zevi escreveu que há na obra de arquitetura um inevitável caráter impositivo. Diferentemente de outros campos da arte, a obra arquitetônica impunha sua presença de forma autoritária e inexorável. Usuários variados podiam não assistir a uma peça de teatro, ou a um filme, ou se recusar a comprar um determinado livro ou obra literária, ou ainda não ir a uma exposição de um artista. Mas com a arquitetura estas opções não existiam, pois sua presença se impunha à paisagem urbana.


A saída inevitável para tal dilema é a ampliação da discussão da adequação de determinadas obras aos seus contextos específicos. A cultura do projeto, que se antecede, simulando os efeitos, benefícios e impactos das novas obras é algo inevitável, que certamente nos defende de muitos desastres anunciados. O desenvolvimento de técnicas de apresentação virtual de projetos, a confecção de maquetes físicas em várias escalas, o confronto de diversas hipóteses de implantação e desenvolvimento são certamente antídotos para a arquitetura feia. 

O duomo de Florença projetado por
Bruneleschi
Recentemente li que Bruneleschi, autor da cúpula de Santa Maria Del Fiori na cidade de Florença, apresentou no concurso em questão uma maquete que descrevia sua solução, mostrando a Comissão da Ópera sua concepção em detalhe. Esta antevisão e debate aprofundado sobre as complexas relações de custo e benefício que toda obra envolve são certamente um antídoto à arquitetura feia. O projeto é certamente um instrumento poderoso para ampliação da efetiva democracia neste campo, e esta não é garantia de acerto, mas da diminuição dos riscos de se produzir uma arquitetura feia

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